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The Gentle Gourmet, restaurante vegano que faz a felicidade até dos onívoros |
Por Bruno Santana, colunista de Gastronomia
Relacionamentos entre pessoas onívoras e vegetarianas/veganas trazem sua generosa cota de contratempos — especialmente quando uma das partes (ou ambas) tem como um dos grandes prazeres da vida a boa mesa e a busca por experiências gastronômicas memoráveis.
Se o dito casal está em Paris, a coisa fica ainda mais complicada: poucas cozinhas do mundo são tão hostis aos não-comedores de produtos animais quanto a francesa, com seus borbotões de manteiga, creme, banha e carne por todo lado. Se o dito casal não fala um pingo de francês além dos eventuais “bonjour” e “un croissant, s’il vous plaît”, então, a coisa já degringola completamente.
Minha viagem à Cidade Luz com Mila, minha então namorada (e hoje boa amiga), foi mais ou menos assim. Em meio à cacofonia de porcas traduções que tentávamos fazer para estabelecer o mínimo de comunicação com garçons e atendentes, minha companheira de viagem — que é totalmente vegana já há uns bons anos — teve que encarar boa parte das suas refeições com saladas sem molho, massas insossas ou sanduíches vegetarianos do Quick. Tudo isso mudou, entretanto, quando conhecemos o Gentle Gourmet.
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O Gentle Gourmet, no Boulevard de la Bastille |
À primeira vista, o restaurante não entrega em nenhum momento sua verdadeira proposta: até que você abra o cardápio, poderá pensar que está num bistrô chique de Paris como qualquer outro. Confesso que, para mim, essa foi uma surpresa e tanto — até então, minha experiência com restaurantes veganos tinha sido composta totalmente de locais alternativos, com um público que você sente ser cativo e basicamente imutável (inclusive, um exemplo delicioso desse tipo de local é o The Food Temple, em Lisboa, sobre o qual pretendo escrever em breve).
O Gentle Gourmet não é nada disso — a ideia é trazer aos comensais uma experiência autêntica (ou quase) da haute cuisine francesa, só que sem absolutamente nenhum ingrediente de origem animal.
Eu tinha minhas dúvidas, não vou negar — e saí totalmente surpreendido.
O Gentle Gourmet não é nada disso — a ideia é trazer aos comensais uma experiência autêntica (ou quase) da haute cuisine francesa, só que sem absolutamente nenhum ingrediente de origem animal.
Eu tinha minhas dúvidas, não vou negar — e saí totalmente surpreendido.
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Bruschetta em pão de fermentação natural e cobertura de de falafel desconstruído com especiarias |
Em primeiro lugar, é preciso deixar claro: se você está procurando um lugar despretensioso e não muito caro, é bom procurar mais. Não fosse a equipe totalmente composta de jovens hipsters extensamente tatuados (muito simpáticos, apesar disso — e falantes de inglês, ainda bem), seria compreensível confundir o Gentle Gourmet com um clássico restaurante com estrela do pelo Michelin, considerando sua aparência externa discreta e a decoração sóbria, com cadeiras confortabilíssimas e louça sofisticada. É Vegan Chic que chama?
Em termos de comida, começamos a noite com uma bruschetta montada no (delicioso) pão de fermentação natural feito na casa; como cobertura, uma espécie de falafel desconstruído com especiarias — muito diferente dos bolinhos de grão de bico árabes a que estamos acostumados, a criação do Gentle Gourmet tem um leve sabor adocicado, talvez de cardamomo. Exótico, porém delicioso: eu lambi os dedos.
Em termos de comida, começamos a noite com uma bruschetta montada no (delicioso) pão de fermentação natural feito na casa; como cobertura, uma espécie de falafel desconstruído com especiarias — muito diferente dos bolinhos de grão de bico árabes a que estamos acostumados, a criação do Gentle Gourmet tem um leve sabor adocicado, talvez de cardamomo. Exótico, porém delicioso: eu lambi os dedos.
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Esse risoto de funghi que me deixou boquiaberto |
As coisas foram ficando ainda mais interessantes nos pratos principais. Pedimos (para compartilhar, claro) um risoto de funghi que me deixou boquiaberto: eu já tinha tentado reproduzir a iguaria em casa, mas nunca sequer sonhei em chegar àquele grau de untuosidade sem usar um grama de manteiga ou queijo. Não me perguntem como eles fazem, talvez seja mágica — o fato é que é divino.
O segundo prato principal foi um sanduíche de shitake com aspargos, tofu defumado (que lembra bacon de um jeito bem curioso) e um fantástico molho de ervas (veja na foto que abre este post). Há quem chame a criação de hambúrguer, mas como em matéria de hambúrguer eu sou um daqueles ortodoxos chatos, direi: o sanduíche estava excepcional, com um pão deliciosamente macio — de novo, veganos são excelentes fazedores de pão.
Melhor ainda estava a maionese vegetal, que, do fundo do meu coração, não deve em nada à versão com gemas; a memória da combinação dela com as batatinhas douradas de acompanhamento ainda causa festa nos meus palatos de tempos em tempos.
O segundo prato principal foi um sanduíche de shitake com aspargos, tofu defumado (que lembra bacon de um jeito bem curioso) e um fantástico molho de ervas (veja na foto que abre este post). Há quem chame a criação de hambúrguer, mas como em matéria de hambúrguer eu sou um daqueles ortodoxos chatos, direi: o sanduíche estava excepcional, com um pão deliciosamente macio — de novo, veganos são excelentes fazedores de pão.
Melhor ainda estava a maionese vegetal, que, do fundo do meu coração, não deve em nada à versão com gemas; a memória da combinação dela com as batatinhas douradas de acompanhamento ainda causa festa nos meus palatos de tempos em tempos.
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As sobremesas, como este sundae desconstruído, quase me derrubam da cadeira de emoção |
O gran finale, por sua vez, é totalmente digno dessa atribuição, pois foram as sobremesas que quase me derrubaram da cadeira, tanto pela sofisticação como pela aparente magia realizada pelo chef confeiteiro — quem já tentou se arriscar na cozinha vegana certamente sabe que os doces são a área mais polêmica, já que ingredientes absolutamente elementares (leite, nata, manteiga, ovo, até mel) estão fora da jogada.
A primeira, um sundae desconstruído com duas perfeitas quenelles de gelato de frutas vermelhas, chantilly de coco, farofa crocante de nozes e morangos. Se ela existisse apenas para ser vista, já estaria de bom tamanho, mas eu tenho o prazer de informar que o gosto estava tão bom quanto o visual. Quiçá melhor.
A primeira, um sundae desconstruído com duas perfeitas quenelles de gelato de frutas vermelhas, chantilly de coco, farofa crocante de nozes e morangos. Se ela existisse apenas para ser vista, já estaria de bom tamanho, mas eu tenho o prazer de informar que o gosto estava tão bom quanto o visual. Quiçá melhor.
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Um dos melhores macarons que já comi - as claras não fizeram falta |
Antes que vocês chamem o sundae vegano de sobremesa impossível, entretanto, esperem até saber da próxima: um macaron gigante em formato de coração com recheio de pistache e kiwi e uma deliciosa calda de framboesa. Não seria um exagero dizer que é um dos melhores macarons que eu comi na vida (e eu comi muitos, acreditem)… e não tem um pingo de clara de ovo. Essa, sim, é a sobremesa impossível. E impecável.
A experiência no Gentle Gourmet não é barata: as entradas e sobremesas variam entre 10€ e 15€, enquanto os pratos principais giram em torno dos 25€. Vale, entretanto, pelo fator novidade e por desbravar uma área da cozinha além de fronteiras que eu julgava intransponíveis; para vegetarianos e veganos, então, é uma parada quase obrigatória em Paris.
The Gentle Gourmet
24 Boulevard de la Bastille 75012 Paris
De terça a domingo, do meio-dia as 14h30 e das 18h30 às 22h
A experiência no Gentle Gourmet não é barata: as entradas e sobremesas variam entre 10€ e 15€, enquanto os pratos principais giram em torno dos 25€. Vale, entretanto, pelo fator novidade e por desbravar uma área da cozinha além de fronteiras que eu julgava intransponíveis; para vegetarianos e veganos, então, é uma parada quase obrigatória em Paris.
The Gentle Gourmet
24 Boulevard de la Bastille 75012 Paris
De terça a domingo, do meio-dia as 14h30 e das 18h30 às 22h
(Nota: como o cardápio do restaurante muda sazonalmente, é possível que os pratos aqui descritos não estejam disponíveis durante a sua visita).
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