20 dezembro 2024

Museu Arqueológico de Delfos na Grécia

Esfinge de Naxos no Museu Arqueológico de Delfos
A Esfinge de Naxos foi uma oferenda dos cidadãos da ilha, no Arquipélago das Cíclades, ao Santuário de Apolo em Delfos

Já disse aqui na Fragata que uma das melhores coisas que você pode fazer por seu coração e sua alma, quando estiver na Grécia, é ir visitar Delfos. E essa visita precisa começar no Museu Arqueológico de Delfos, uma aula deslumbrante sobre o que a gente vai ver a seguir, nas ruínas do Santuário de Apolo, centro espiritual do mundo helênico na Antiguidade. 

O Museu Arqueológico de Delfos, tanto quanto as ruínas do santuário, é essencial pra a gente entender a força da ideia de Grécia antes que houvesse uma Grécia (ao menos como nós a conhecemos hoje).

Ainda que a Grécia não formasse uma unidade política, ritos como a consulta ao Oráculo de Delfos e competições esportivas como os Jogos Olímpicos e os Jogos Pítios (realizados em Delfos) foram elementos que forjaram uma identidade grega para além da fragmentação e rivalidade das cidades-Estado.

"O Auriga" de Delfos no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
O Auriga de Delfos é um dos achados mais importantes do sítio arqueológico

Os Kouroi do Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Com quase 3 mil anos de idade, as estátuas de Cleobis e Bitão estão entre os exemplares mais significativos da escultura grega do Período Arcaico

Era no Santuário de Apolo, no famoso Oráculo de Delfos, que a Pitonisa (sacerdotisa do deus Sol) previa o destino de reis, comandantes militares, navegadores, poetas, heróis e até semi-deuses que vinham de todos os cantos do Mediterrâneo. pra conhecer seu futuro. 

Basta um enredo desses pra tornar a visita a Delfos imprescindível. E é o Museu Arqueológico de Delfos que nos prepara pra mergulhar no significado dessa história fundamental à compreensão do mundo grego.

Veja que espetáculo é o museu que guarda os tesouros do Santuário de Apolo em Delfos:

Museu Arqueológico de Delfos


Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
O Museu Arqueológico de Delfos quase empata em número de visitantes anuais com o Museu Nacional de Arqueologia de Atenas

O Museu Arqueológico de Delfos não chega a ser grande — tem apenas 14 salas — mas seu acervo deixa o coração da gente aos pulos.

Um fato que atesta a importância do museu de Delfos é que ele quase empata com o magnífico Museu Nacional de Arqueologia de Atenas em número de visitantes anuais — ainda que esteja a mais de 200 km de distância da capital e fora de rotas mais fervidas, como as ilhas e o Peloponeso.

Tesouro dos Atenienses no Sítio Arqueológico de Delfos
Tesouro dos Atenienses no Sítio Arqueológico de Delfos
Alguns dos achados arqueológicos mais preciosos em Delfos foram escavados nos tesouros, edifícios onde as diversas cidades do mundo helênicos guardavam suas oferendas a Apolo e à Pitonisa. Este é o Tesouro dos Atenienses, reconstruído para que os visitantes possam compreender como eram essas estruturas

É que Delfos não tem praia, mas é — junto com OlímpiaO lugar pra a gente entender a formação da identidade grega na Antiguidade, apesar da fragmentação política em centenas de cidades-estado independentes (e geralmente rivais) que se espalhavam pelo território da atual Grécia e muito além.

Na minha primeira viagem a Delfos, eu estava em um tour e não tive a oportunidade de ver o Museu Arqueológico de Delfos. Meu padrinho Hermes, que é deus das viagens e da comunicação, providenciou minha segunda chance. Agora eu posso confirmar o que eu já desconfiava: ver o Santuário de Apolo depois de visitar o museu faz muita diferença.

Decoração do Tesouro de Sifnos no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Decoração do Tesouro de Sifnos no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
A presença de Tesouros mantidos por cidadãos de diversas ilhas Cíclades, como Paros e Naxos, atesta a riqueza do arquipélago na Antiguidade. Acima e no alto, detalhes da decoração do Tesouro de Sifnos, uma das Cíclades

Quando se fala que Delfos era o centro do mundo (helênico), não é exagero. Nem geográfica nem culturalmente.

Conta a lenda que Zeus soltou duas águias e as fez contornar a terra, cada uma em uma direção. As águias se encontraram exatamente sobre Delfos, no local que hoje está assinalado pela pedra do Ônfalo (Ὀμφαλός, em grego, ou "umbigo"). Para consagrar o mito, um marco foi colocado no local onde teriam pousado as aves. Hoje, o padrão original está exposto no Museu Arqueológico de Delfos.

Figuras micênicas no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Essas figuras típicas do período micênico eram objetos votivos usados em rituais religiosos

Fora da mitologia, o que a ciência sabe é que o Santuário de Apolo em Delfos foi construído no ponto exato de uma falha geológica, de onde emanavam vapores do centro da terra. 

Era esse hálito das entranhas do planeta que a Pitonisa aspirava para chegar ao transe que a permitia ver o futuro. E vinha gente de todos os cantos do mundo helênico pra consultá-la.

Caldeirão de bronze do Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Os caldeirões de bronze apoiados sobre tripés eram usados para rituais de oferendas
Armas e capacetes ofertados ao Santuário de Apolo em Delfos
Guerreiros costumavam oferecer armas e elmos em agradecimento por batalhas vencidas ou pedindo proteção para embates futuros

A consulta ao oráculo era parte de um ritual sofisticado, com sacrifícios, oferendas e subida do Caminho Sagrado. E basta ver a coleção de peças expostas no museu pra perceber a importância do Santuário de Apolo e do Oráculo de Delfos para o universo helênico.

O Museu Arqueológico exibe oferendas oriundas das mais distantes localidades do mundo grego, desde a Ásia Menor (atual Turquia, passando por Marselha (atual França) e, claro, cidades espalhadas pelo continente e as ilhas que hoje formam a Grécia Moderna.

Cleobis e Bitão, kouroi do Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Cleobis e Bitão também eram gêmeos imortalizados por seu sacrifício pela deusa Hera
Métopa (elemento decorativo) da fachada do Tesouro da cidade de Sícion. A cena representa os gêmeos Castor e Pólux

Essas oferendas eram guardadas nos Tesouros, edifícios construídos e cuidados pelas diversas cidades, que tratavam essas construções como atestado de poder e prosperidade, cada uma tentando sobrepujar a outra em luxo, detalhe e beleza.

Pra ter uma ideia da sofisticação desses edifícios, preste atenção aos elementos decorativos dos tesouros de Atenas, da Ilha de Sifnos (no Arquipélago das Cíclades) e da cidade de Sícion, no Peloponeso, que estão expostos no museu.

O conteúdo e a decoração dos Tesouros nos permite ter uma ideia da pujança de cada cidade grega. 

Uma dessas peças é a Esfinge de Naxos (oferenda da Ilha de Naxos, no Arquipélago das Cíclades), datada do ano de 560 a.C. Com mais de dois metros de altura, ela ficava sobre uma coluna, ao lado do Templo de Apolo. Hoje é a estrela de uma das salas mais concorridas do museu.

Estátua criselefantina de Apolo no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Touro de Prata de Delfos
Algumas das preciosidades escavadas ao longo do Caminho Sagrado de Delfos: no alto, a estátua criselefantina de Apolo. Acima, o Touro de Prata, em tamanho quase natural, com detalhes em ouro

O roteiro da visita ao Museu Arqueológico de Delfos segue uma ordem cronológica que nos faz caminhar por uma história iniciada há 34 séculos, nas origens do Santuário de Apolo, e só encerrada no ano 390 de nossa era, quando o imperador romano Teodósio, em nome do cristianismo, ordenou a destruição do local. 

(Um detalhe importante sobre a visita ao museu: é preciso seguir um roteiro. Para facilitar o fluxo, não é permitido a ficar indo e voltando entre as salas. 

Portanto, se você topar com clássica situação de um grupo de excursão e seu guia, monopolizando determinada obra durante uma longa explicação, não passe adiante para voltar mais tarde. Espere um pouco pra ver a peça. Se não, não você terá que ir até a última sala, voltar ao lobby do museu e recomeçar o percurso.)

No roteiro cronológico do Museu Arqueológico de Delfos a gente passa por todas as fases da arte grega. Estão lá as figurinhas votivas tão características da arte micênica, ex-votos de todos os tipos (inclusive armas e elmos de guerreiros), caldeirões de bronze usados em rituais de oferendas e muitas, muitas estátuas de diversos períodos da arte helênica.

Frontão do Templo de Apolo em Delfos
Frontão do Templo de Apolo em Delfos
Frontão Arcaico do Templo de Apolo

Um exemplo são as impressionantes estátuas conhecidas como os Kouroi de Delfos, esculpidos em Argos no final do Século 7º ou início do Século 6º a.C.

O kouros (plural kouroi) é uma figura masculina, sempre representada nua, sorridente e com os cabelos frisados, o ideal de beleza do Período Arcaico (entre 800 a.C e 500 a.C.).

Os Kouroi de Delfos representam os gêmeos Cleobis e Bitão. A história deles parece horrível ao olhar contemporâneo, mas era uma narrativa com final feliz, na Antiguidade.

Filhos de uma devota da deusa Hera, Cleobis e Bitão acompanhavam a mãe que ia fazer um sacrifício á divindade. O touro que puxava a carroça da família morreu e os irmãos assumiram seu lugar. Comovida, a mãe pediu a Hera que recompensasse seus filhos e, então, a deusa os fez adormecer pra sempre, no auge da beleza, força e juventude.

Decoração do Tesouro dos Atenienses no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Decoração do Tesouro dos Atenienses no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Decoração do Tesouro dos Atenienses no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Métopas do Tesouro dos Atenienses
Cabeça de guerreiro do Tesouro de Massália
Esta cabeça de guerreiro, em mármore, estava no Tesouro de Massália, coleção de oferendas da cidade grega que deu origem à atual Marselha (França)

Um conjunto impressionante exposto no museu são as estátuas criselefantinas do dono do santuário e sua família, no caso, Apolo (deus Sol), sua irmã gêmea, Artemis (deusa da Lua e das caçadas), e a mãe de ambos Leto (ou Latona, deusa do anoitecer).

(Criselefantina parece uma coisa esquisita, mas é o nome que se dá a uma escultura executada em ouro e marfim).

Incensário de Paros no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Incensário em bronze produzido na Ilha de Paros, Arquipélago das Cíclades no Século 5º a.C.
Cabeça de mulher no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Esta cabeça feminina do Século 4º a.C. ainda guarda traços das cores que a adornavam. As estátuas gregas eram vivamente coloridas, mas o tempo levou os pigmentos e deixou a impressão de que o mármore era deixado em sua aparência natural
As Dançarinas de Delfos no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
As Dançarinas de Delfos no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
As Dançarinas de Delfos, encontradas próximas ao Templo de Apolo, são do Século 4º a.C. Elas inspiraram um prelúdio de Claude Debussy

O coração do santuário, naturalmente, era o Templo de Apolo, com origem no Século 7º a.C. No sítio arqueológico ainda é possível ver seu traçado e algumas de suas colunas.

No museu, é possível ver fragmentos da decoração do Templo de Apolo em duas épocas distintas, do Período Arcaico e do Período Clássico.

Outro edifício importante no santuário era o Templo de Atena Pronaia. Duas salas do museu estão dedicadas a exibir objetos e elementos decorativos escavados lá.

Estátua de Apolo no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Estátua de Apolo
Estátua de Antínoo no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Estátua de Antínoo no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Na seção greco-romana do museu, o destaque é a estátua de Antínoo, o grande amor do Imperador Adriano, morto antes do 20 anos de idade e deificado por ordem do governante


O museu também tem uma sala dedicada ao período greco-romano. Os romanos invadiram a Grécia no Século 2º a.C., e deram continuidade ao culto a Apolo e as consultas ao Oráculo de Delfos.

Nessa parte da coleção, o destaque é a estátua de Antínoo, o amor do imperador Adriano morto de maneira meio misteriosa durante uma viagem de barco pelo Rio Nilo, no Egito. Adriano o transformou em deus por decreto e o culto a Antínoo, associado ao deus egípcio Osíris, chegou a ser muito popular. 

"O Auriga de Delfos" no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
"O Auriga de Delfos" no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
O Auriga de Delfos, em tamanho natural, era parte de um conjunto que incluía a quadriga conduzida por ele e os quatro cavalos. A escultura foi encontrada no Templo de Apolo
Esfinge de Naxos no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Esfinge de Naxos no Museu Arqueológico de Delfos na Grécia
Uma das salas mais concorridas do museu exibe a Esfinge de Naxos

Já no finalzinho da visita, na 13ª sala, o Museu Arqueológico de Delfos guarda o que talvez seja seu maior espetáculo (ainda que seja uma eleição difícil). O chamado Auriga de Delfos é uma estátua de bronze encontrada no Templo de Apolo, impressionantemente bem preservada. A obra é do Século 4º a.C.

Aurigas era os condutores de carros de combate, geralmente quadrigas (puxado por quatro cavalos), que desempenhavam papel estratégico nas batalhas da Antiguidade.

As corridas de bigas e quadrigas também se tornaram populares como esporte e entretenimento. O Auriga de Delfos, em tamanho natural, era parte de um conjunto que não sobreviveu ao tempo, composto pela quadriga e os cavalos.

O conjunto teria sido dedicado ao Templo de Apolo pelo governante da cidade grega de Gela, na atual Sicília, em agradecimento por sua vitória em uma corrida durante os Jogos Pítios, competição esportiva quadrienal realizada em Delfos que só perdia em importância para os Jogos Olímpicos.

Veja os outros posts sobre Delfos pra organizar sua visita a esse museu maravilhoso:

Delfos, o centro do mundo (visita ao sítio arqueológico)
Roteiro na Grécia, o país azul (viagem de 2012)

Grécia na Fragata Surprise


Curtiu este post? Deixe seu comentário na caixinha abaixo. Sua participação ajuda a melhorar e a dar vida ao blog. Se tiver alguma dúvida, eu respondo rapidinho. Por favor, não poste propaganda ou links, pois esse tipo de publicação vai direto para a caixa de spam.

Navegue com a Fragata Surprise 
X (ex-Twitter) | Instagram | Facebook | Bluesky | Threads

Nenhum comentário:

Postar um comentário