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Paço das Escolas: o antigo palácio real português virou o
coração da Universidade de Coimbra |
Como não adorar uma cidade que vive em torno de sua universidade? E se essa cidade for Coimbra — com suas ladeiras mouras e suas vistas arrebatadoras para o Rio Mondego — aí é que o caso de amor fica incontornável e irreversível.
Tive a alegria de voltar lá durante a viagem de junho a Portugal, desta vez com um pouco mais de tempo pra namorar o meu xodó português e, finalmente, fazer uma visita à Universidade de Coimbra bem detalhadinha.
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A longa varanda que domina a fachada do Paço das Escolas
chama-se Via Latina e é um acréscimo do Século 18 |
Percorri com calma os ambientes históricos da Universidade de Coimbra: o Paço das Escolas, a Capela de São Miguel e a Biblioteca Joanina, espaços belíssimos e cheios de significado.
Mas o grande encantamento de uma visita à Universidade de Coimbra é que ela não é uma apenas um acervo de memórias. É um organismo vivo, com aulas, movimento de alunos.
Em pleno funcionamento, a Universidade é o coração que bate ditando o ritmo de Coimbra.
Em pleno funcionamento, a Universidade é o coração que bate ditando o ritmo de Coimbra.
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O sino na Torre da Universidade ainda comanda o ritmo de Coimbra. No alto, um detalhe da decoração da Via Latina |
Adoro museus e ruínas, mas a visita à Universidade de Coimbra é a chance de ver ao vivo um percurso sendo trilhado. Uma história que começou no Século 13 e ainda está acontecendo, plena de cotidiano, tanto quanto de efemérides.
Estar em um lugar assim é muito mais emocionante do que escutar um relato do que já foi. Veja como foi essa visita:
A Universidade de Coimbra oferece diversos roteiros de visita turística a suas dependências. Escolhi o programa que combina o Paço das Escolas com a Capela de São Miguel e a Biblioteca Joanina.
Também é possível subir à Torre da Universidade e visitar o Colégio de Jesus, do Século 16, o colégio jesuíta mais antigo de Portugal e, posteriormente, transformado em espaço para o estudo das ciências naturais.
Também é possível subir à Torre da Universidade e visitar o Colégio de Jesus, do Século 16, o colégio jesuíta mais antigo de Portugal e, posteriormente, transformado em espaço para o estudo das ciências naturais.
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D. João III contempla sua obra. A estátua do rei, no centro
do Pátio das Escolas, é da década de 50 do Século 20 |
Por exemplo, o Jardim Botânico da Universidade de Coimbra, criado no Século 18 para promover o estudo das ciências naturais. São 13 hectares de alamedas, fontes e, claro, plantas trazidas de diversas partes do mundo, bem no coração da cidade.
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A Torre da Universidade, com cerca de 30 metros de altura, funciona
também como mirante, para a contemplação do conjunto arquitetônico do Paço |
Os Arcos do Jardim são uma obra do Século 16, reaproveitamento da estrutura de um aqueduto romano que era parte do sistema de abastecimento de água da área do antigo castelo (hoje o campus da Universidade de Coimbra).
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O Jardim Botânico da Universidade de Coimbra fica na encosta
do morro onde se assenta o Paço das Escolas. No alto, a Escadaria de Minerva,
um dos acessos ao campus |
O que ver na Universidade de Coimbra
O Largo D. Dinis é a “antessala” do núcleo histórico da Universidade de Coimbra. Lá está a estátua do rei fundador da instituição, cercada por edifícios modernos, datados na metade do Século 20, como os prédios do Departamento de Matemática e do Departamento de Relações Internacionais.
Os prédios da Faculdade de Medicina e dos Institutos de Química e de Física margeiam a Rua Larga, que leva até à famosa Porta Férrea, o acesso solene à área histórica do campus.
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Aqueduto de São Sebastião, mais conhecido como Arcos do
Jardim |
Mesmo para quem vem só de visita, como eu, dá um friozinho na barriga atravessar esse portal tão cheio de significados. A Porta Férrea é a entrada cerimonial da Universidade de Coimbra. É por ela que ingressam os novos estudantes, envergando a tradicional capa negra, na solenidade de início da vida acadêmica.
Do outro lado da Porta Férrea estão o imenso Pátio das Escolas, com sua vista inacreditável para Coimbra, o Paço das Escolas, a Biblioteca Joanina e a Capela de São Miguel, entre outras construções históricas.
Do outro lado da Porta Férrea estão o imenso Pátio das Escolas, com sua vista inacreditável para Coimbra, o Paço das Escolas, a Biblioteca Joanina e a Capela de São Miguel, entre outras construções históricas.
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Pichação em um muro da Universidade: "Não queremos uma
fatia do bolo. Queremos a p* da confeitaria inteira" |
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Os edifícios modernos da Universidade, em art déco, estão
dispostos em torno do antigo Paço. Foram construídos em meados do Século 20 |
O Paço das Escolas, edifício principal da Universidade de Coimbra, tem uma história fascinante. Ele está lá muito antes da primeira aula ser ministrada, ocupando, com feições diversas, o ponto mais alto da cidade.
No local onde se assenta o Paço já pulsou o centro político da povoação romana de Aeminium. Também foi o local escolhido pelos mouros como o sítio de sua Alcáçova, (fortaleza onde viviam os governantes no tempo do domínio muçulmano).
Também foi lá que o primeiro rei português, D. Afonso Henriques, plantou a sede de sua corte, no Século 12, no primeiro Paço Real do jovem Portugal.
Também foi lá que o primeiro rei português, D. Afonso Henriques, plantou a sede de sua corte, no Século 12, no primeiro Paço Real do jovem Portugal.
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A Faculdade de Medicina, no Largo da Porta Férrea |
Olhando em volta, é preciso concordar que não haveria posição mais estratégica para colocar a sede do poder militar e político de uma cidade.
Do vasto pátio que se estende diante do Paço das Escolas, debruçado sobre a encosta, o olhar ainda alcança uma larga faixa do Rio Mondego e todo o movimento de suas margens. Do ponto de vista defensivo, não haveria lugar melhor.
Do vasto pátio que se estende diante do Paço das Escolas, debruçado sobre a encosta, o olhar ainda alcança uma larga faixa do Rio Mondego e todo o movimento de suas margens. Do ponto de vista defensivo, não haveria lugar melhor.
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A Porta Férrea é a entrada cerimonial da Universidade de
Coimbra |
Mas Coimbra é especial. Em vez de as armas, muralhas e ameias, o ponto culminante da cidade abriga, desde o Século 16, uma instituição voltada para a investigação, o aprendizado e a preservação do saber. Dá pra não amar?
A Universidade de Coimbra não nasceu na cidade. A instituição foi fundada no Século 13, por ordem do rei D. Dinis, e alternou sua sede entre Coimbra e Lisboa. Foi só em 1537 que D. João III determinou sua fixação definitiva às margens do Rio Mondego.
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Fiquei boba diante da decoração da Sala dos Capelos, no Paço das Escolas. Abaixo, a Sala das Armas |
Só então a Universidade de Coimbra ganharia uma residência definitiva. O local escolhido foi o antigo Paço Real de Coimbra.
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Durante a visita, é normal se distrair com as cenas de
Coimbra que invadem o Paço das Escolas por suas janelas, como essa vista para a
Sé Velha. No alto, o Salão Amarelo |
É impossível não ficar de queixo caído com a beleza dos ambientes no interior do Paço das Escolas. Uma escadaria dupla liga o Pátio das Escolas à Via Latina, a elegante varanda que compõe a fachada do edifício. Ao cruzar a monumental porta de entrada, você encontrará uma sequência de quatro salões magníficos.
Salões do Paço das Escolas
O primeiro salão do Paço das Escolas é a Sala das Armas, que abrigava a antiga Guarda Real Acadêmica, um corpo de alabardeiros que mantinham a segurança do campus (alabarda é uma espécie de lança com um gume similar ao de um machado, na ponta, celebrizada nas imagens da Guarda Suíça do Vaticano, responsável pela segurança dos papas).
Não esqueça de olhar para o alto para admirar a bela pintura mural da decoração no forro da Sala das Armas.
Não esqueça de olhar para o alto para admirar a bela pintura mural da decoração no forro da Sala das Armas.
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A Sala do Exame Privado é o antigo apartamento real, hoje usada para a cerimônia de abertura do ano letivo |
Ao lado da Sala das Armas está o Salão Amarelo, que ganhou esse nome da cor da seda que reveste suas paredes. Lá estão em exibição retratos de alguns reitores da Universidade.
Seguindo o longo corredor que contorna os salões (e refreando a tentação de parar em cada uma de suas janelas e balcões pra namorar os telhados de Coimbra que se esparramam lá embaixo), chega-se à estonteante Sala dos Capelos, antiga sala do trono, quando o Paço das Escolas ainda era o Paço Real. (Capelo é aquele chapeuzinho que se usa na formatura).
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A visita inclui um passeio pelas varandas do Paço |
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Restos de um mosaico romano e um anjo expostos no Paço das
Escolas |
Nessa antiga Sala do Trono, as paredes vermelhas, o mobiliário escuro em madeiras nobres e os retratos dos reis são magníficos, mas não são páreo para os painéis em dourado e prateado que decoram o teto da Sala dos Capelos, com delicados desenhos, uma obra executada no Século 17.
Esse salão, antes dedicado aos atos de governo dos primeiros reis, agora abriga as solenidades mais importantes da vida acadêmica em Coimbra.
O último salão do roteiro é a Sala do Exame Privado, o antigo apartamento real, hoje usada para a cerimônia de abertura do ano letivo.
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Altar-mor da Capela de São Miguel, do Século 17 |
Capela de São Miguel
A Capela de São Miguel era a capela real, quando a corte portuguesa ainda tinha sua sede em Coimbra.
A construção do Século 11, porém, já não é reconhecível sob a feérica beleza resultante de reformas feitas nos séculos 17 e 18.
A construção do Século 11, porém, já não é reconhecível sob a feérica beleza resultante de reformas feitas nos séculos 17 e 18.
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O forro da capela e o órgão do Século 18, adornado com chinesices,
elementos incorporados às artes decorativas portuguesas pelos artesãos de
Macau, feitoria de Portugal na China |
Apesar da profusão de elementos decorativos, a harmonia no interior da Capela de São Miguel é impressionante.
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Detalhes da decoração do órgão, com elementos em chinesices |
Como tudo na Universidade de Coimbra, a Capela de São Miguel ainda está viva, com missa todos os domingos e concertos de órgão em ocasiões solenes.
Biblioteca Joanina
Pena que não é permitido fotografar o interior da Biblioteca Joanina, mas acredite em mim: poucas vezes na vida você vai encontrar um lugar tão apaixonante.
Construída no Século 18, por ordem de D. João V, a Biblioteca Joanina ela já nasceu como uma das mais ricas coleções europeias, reunindo o que havia de mais importante no conhecimento ocidental da época. Um templo ao conhecimento bancado com o ouro do Brasil.
E templo não é só força de expressão. Há uma proposital citação da arquitetura religiosa nos três salões monumentais contíguos da Biblioteca Joanina.
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Por trás desta porta da Biblioteca Joanina mora um dos tesouros mais lindo que já vi |
Essas referências estão nas pinturas decorativas dos tetos, na solenidade das estantes, decoradas com folha de ouro e motivos chineses, abrigo para os 55 mil livros da Biblioteca Joanina, e na majestade dos portais de pedra que interligam os salões.
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O porão é a única área da Biblioteca Joanina que pode ser
fotografada. O esplendor de capela Sistina do corpo principal você terá que ir
ver pessoalmente 😉 |
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O porão do edifício já foi uma prisão |
As paredes da Biblioteca Joanina têm mais de dois metros de espessura, transformando o espaço em uma espécie de caixa forte, onde a temperatura e umidade são perfeitamente controladas.
Isso contribui para a conservação dos livros, mas também para a preservação da decoração, que é praticamente a original, sem desbotar ou mofar.
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O Pátio da Faculdade de Direito, no interior do Paço das
Escolas, ainda preserva pisos em mármore e painéis de azulejos |
Mas o esplendor não é tudo. A Biblioteca Joanina já seria espetacular se fosse apenas um depósito de maravilhas mortas apenas para deleite colecionista e para a memória.
A biblioteca é um organismo que prossegue em atividade, 300 anos após sua fundação, permitindo a pesquisa e o acesso ao conhecimento contido em obras raras e de valor inestimável.
Além das consultas presenciais franqueadas a pesquisadores, boa parte do acervo da Biblioteca Joanina está digitalizado e acessível a qualquer mortal, pelo portal almamater.uc.pt.
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A Cafeteria da Universidade de Coimbra estava animadíssima,
no dia da minha visita |
Como organizar a visita à Universidade de Coimbra
Os espaços externos da Universidade de Coimbra têm visitação livre e gratuita. Para realizar um dos percursos históricos, é preciso comprar o ingresso (o preço varia de acordo com o roteiro) na bilheteria que funciona na Biblioteca Central, no Largo da Porta Férrea, em frente à Faculdade de Medicina.
➡️ Ao comprar o bilhete, é preciso agendar o horário de entrada na Biblioteca Joanina, onde são admitidos grupos de no máximo 60 pessoas para um percurso de 20 minutos (as fotos só são permitidas no subsolo, antiga área da prisão).
➡️ Ao comprar o bilhete, é preciso agendar o horário de entrada na Biblioteca Joanina, onde são admitidos grupos de no máximo 60 pessoas para um percurso de 20 minutos (as fotos só são permitidas no subsolo, antiga área da prisão).
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Cartazes das chapas concorrentes à diretoria do Centro
Acadêmico de Direito (no alto) e anúncios variados na cafeteria |
➡️ As visitas à Universidade de Coimbra podem ser feitas diariamente, das 9h às 19:30h, de março a outubro. De novembro a março o horário é 9:30h às 13h e das 14h às 17:30h. Confira todos os horários aqui.
➡️ Como disse, escolhi o percurso que conjuga o Paço das Escolas, a Capela de São Miguel e a Biblioteca Joanina (programa 3). Esse roteiro custa € 10.
Portugal na Fragata Surprise
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