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Típica igreja da comunidade ucraniana, dedicada a Nossa Senhora do Salete, na área rural de União da Vitória |
Visitar o interior do Paraná é também encontrar uma História do Brasil que passa longe dos livros escolares e da memória do resto do País.
Na rota dos tropeiros, rebeldes e colonos, a gente descobre episódios que contribuíram de maneira decisiva para traçar a identidade da região, mas que permanecem alijados da historiografia maisntream (como se as realidades regionais não pertencessem ao Brasil).
São histórias como a da Guerra do Contestado (1912-1916) — conflito armado entre posseiros e pequenos proprietários de terras e grandes fazendeiros apoiados pelos governos locais e a União — do Cerco da Lapa e das diversidades enfrentadas pelos diversos grupos de colonos europeus que atravessaram o Atlântico e ajudaram a formar o Paraná.
Na rota dos tropeiros, rebeldes e colonos, a gente descobre episódios que contribuíram de maneira decisiva para traçar a identidade da região, mas que permanecem alijados da historiografia maisntream (como se as realidades regionais não pertencessem ao Brasil).
São histórias como a da Guerra do Contestado (1912-1916) — conflito armado entre posseiros e pequenos proprietários de terras e grandes fazendeiros apoiados pelos governos locais e a União — do Cerco da Lapa e das diversidades enfrentadas pelos diversos grupos de colonos europeus que atravessaram o Atlântico e ajudaram a formar o Paraná.
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A cidade histórica da Lapa, a 50 km de Curitiba, fortemente marcada pela tradição tropeira |
Outro aspecto interessante é a tradição tropeira do Paraná, ainda muito presente em cidades como a Lapa e União da Vitória, ambas fundadas no caminho das tropas que começaram a desbravar os Campos Gerais e o Vale do Rio Iguaçu no Século 18.
Passei alguns dias percorrendo a rota dos tropeiros, rebeldes e colonos e encontrei um Paraná bem diferente do que aparece nos cartões postais. Veja as dicas e descubra você também esse pedaço da História do Brasil:
Tropeiros, rebeldes e colonos no Paraná
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Caminho das Tropas, antiga trilha de tropeiros, na Lapa |
Para padrões paranaenses, a Lapa é uma cidade antiga (pra quem é de Salvador, como eu, qualquer lugar fundado depois do Século 16 é um broto). Sua origem é uma povoação do Século 18, elevada à condição de cidade em 1872.
A cidade é fortemente marcada pela tradição tropeira é é boa opção de bate e volta a partir de Curitiba: só 50 km de distância.
A cidade é fortemente marcada pela tradição tropeira é é boa opção de bate e volta a partir de Curitiba: só 50 km de distância.
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A Igreja Matriz de Santo Antônio, de 1769, é uma das construções mais antigas da Lapa |
A Lapa prosperou com o crescimento de importância da rota que ligava Viamão, no Rio Grande, a Sorocaba (SP), conduzindo as valiosas mulas que iriam ser vendidas na cidade paulista e cujo destino final era o transporte do ouro nas Minas Gerais.
Essa prosperidade legou à Lapa tem um belo casario do Século 19, onde se destacam o adorável Theatro São João, com galerias elisabetanas, e a Casa Lacerda.
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"Tropeiros" e "legalistas" (abaixo) encenam os momentos decisivos do cerco da Lapa, episódio da Revolução Federalista de 1894 |
Passei apenas uma noite na cidade, mas o roteiro foi movimentado. Primeiro, assistimos a uma representação teatral do Cerco da Lapa.
O episódio, que é o maior orgulho local, foi recriado nas ruas com direito a cavalaria, canhões e trajes de época.
Combatendo desigualmente — os legalistas da Lapa não chegavam a 1 mil, contra três mil atacantes — eles resistiram a 26 dias de assédio, ao fim dos quais a cidade caiu por falta de munição e comida.
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O fofíssimo Theatro São João |
Depois acompanhar a recriação da batalha, deu tempo de assistir a uma jam session do Paraná Jazz Festival, que estava rolando no Theatro São João.
A noite foi encerrada com um jantar típico tropeiro delicioso, onde conheci a fantástica quirera lapeana (tem um post todinho sobre a gastronomia das colônias do Paraná aqui no blog).
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As galerias elisabetanas do Theatro São João, na Lapa, lotaram para a apresentação do Paraná Jazz Festival |
Lamentei profundamente ter passado apenas uma noite na Lapa. Acho que teria adorado explorar seu patrimônio arquitetônico e o antigo Caminho das Tropas, hoje a rua principal da cidade, uma simpática alameda arborizada que faz as vezes de ciclovia e pista de caminhadas.
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A antiga trilha de tropeiros é hoje usada pelos moradores da Lapa para suas caminhadas matinais |
União da Vitória
Às margens do Rio Iguaçu, na divisa com Santa Catarina, União da Vitória é a síntese desse Paraná de tropeiros, rebeldes do Contestado e colonos europeus.
Os imigrantes, principalmente ucranianos e poloneses, começaram a chegar à região no Século 19, estabelecendo colônias, encantando a paisagem com suas construções de madeira e contribuindo para fixar as bochechas rosadas como um dos estereótipos que nós, cá de fora, associamos ao Paraná.
Os imigrantes, principalmente ucranianos e poloneses, começaram a chegar à região no Século 19, estabelecendo colônias, encantando a paisagem com suas construções de madeira e contribuindo para fixar as bochechas rosadas como um dos estereótipos que nós, cá de fora, associamos ao Paraná.
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Além do patrimônio histórico, União da Vitória também oferece opções de ecoturismo |
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Esta bela mata de xaxins esconde a Cachoeira Cintura de Noiva, em União da Vitória, uma área de lazer nos arredores da cidade |
União da Vitória, com cerca de 50 mil habitantes, vem fazendo um grande esforço para resgatar essa memória e essa síntese.
São iniciativas do poder público (a Prefeitura vem adquirindo os imóveis históricos ao longo da linha do trem, que corta a cidade, estopim da Guerra do Contestado e decisiva para o desenvolvimento da região) e de particulares.
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Apresentação do balé ucraniano Kalena, no Cine Teatro Luz de União da Vitória |
A comunidade ucraniana de União da Vitória, por exemplo, mantém viva a tradição de seus antepassados.
Uma dessas iniciativas é o Grupo Folclórico Kalena, que ensaia e se apresenta no belo Cine Teatro Luz, um edifício art deco de cujo charme a cidade talvez ainda não tenha se dado conta.
A arquitetura dos pioneiros e dos colonos de União da Vitória também é preservada nas construções transplantadas, peça por peça, para o Parque Histórico Iguassu.
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Este moinho foi desmontado peça por peça e remontado no Parque Histórico de Iguassu. Pertencia a uma colona polonesa |
Esse empreendimento tocado pelo casal Dago e Joana Wohel reproduz também uma trilha de tropeiros, cenários da Guerra do Contestado e uma moenda de erva mate, onde os visitantes podem conhecer todo o processo artesanal de beneficiamento da planta.
E como se come bem lá no Parque Histórico do Iguassu (sim, está no próximo post...).
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Espetáculo sobre a Guerra do Contestado apresentado pela Escola de Cinema e Teatro de União da Vitória |
Outra iniciativa bacana em União da Vitória é a Escola de Cinema e Teatro dirigida pelo ator, diretor e cineasta Lício Ferreira.
O grupo ensaia nas praças da cidade e apresenta estudantes, moradores de periferia e trabalhadores rurais ao mundo das artes cênicas.
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A Escola de Cinema e Teatro de União da Vitória atualmente encena um espetáculo que conta a história da Guerra do Contestado e conclama: "Não conteste o Contestado sem saber suas razões".
A Guerra do Contestado
Eu tinha ouvido falar muito pouco da Guerra do Contestado, um conflito entre trabalhadores rurais e latifundiários que, ao longo de quatro anos, teria causado a morte de oito mil pessoas, em sua maioria, camponeses.
Minha passagem pelas cidades da Lapa e de União da Vitória foi providencial para que eu aprendesse um pouquinho mais sobre esse pedaço da nossa história.
As razões e origens da Guerra do Contestado são muito parecidas com as de tantos conflitos contemporâneos: a concentração de terras e a exploração do trabalhador rural pelos coronéis. O estopim religioso aproxima o episódio da Guerra de Canudos.
Entre 1912 e 1916, a região conhecida como Contestado — faixa de terra disputada pelo Paraná e por Santa Catarina — foi sacudida por uma rebelião de camponeses que viviam em condições miseráveis e que encontraram seu líder em um pregador messiânico, o “monge” Zé Maria.
A desconfiança dos poderosos que os séculos de abandono instigou os camponeses a uma espécie de “guerra santa” contra uma ferrovia, cuja construção resultou na expulsão de grandes contingentes de posseiros das terras onde trabalhavam.
A Guerra do contestado também comprova que o Paraná — aquele estado que lembra o colega de classe “certinho”, de quem todo mundo inveja as boas notas, mas esquece de convidar para as festas — tem uma história muito mais movimentada e rica do que a gente imagina.
Minha passagem pelas cidades da Lapa e de União da Vitória foi providencial para que eu aprendesse um pouquinho mais sobre esse pedaço da nossa história.
As razões e origens da Guerra do Contestado são muito parecidas com as de tantos conflitos contemporâneos: a concentração de terras e a exploração do trabalhador rural pelos coronéis. O estopim religioso aproxima o episódio da Guerra de Canudos.
Entre 1912 e 1916, a região conhecida como Contestado — faixa de terra disputada pelo Paraná e por Santa Catarina — foi sacudida por uma rebelião de camponeses que viviam em condições miseráveis e que encontraram seu líder em um pregador messiânico, o “monge” Zé Maria.
A desconfiança dos poderosos que os séculos de abandono instigou os camponeses a uma espécie de “guerra santa” contra uma ferrovia, cuja construção resultou na expulsão de grandes contingentes de posseiros das terras onde trabalhavam.
A Guerra do contestado também comprova que o Paraná — aquele estado que lembra o colega de classe “certinho”, de quem todo mundo inveja as boas notas, mas esquece de convidar para as festas — tem uma história muito mais movimentada e rica do que a gente imagina.
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Moenda de erva mate o Parque Histórico de Iguassu |
Os colonos no Paraná
Talvez a face mais conhecida do Paraná — e a que mais contribui para sua fama de "certinho", na visão eurocêntrica que acha que só há um jeito de ser civilizado — seja exatamente a que exibe os traços claros e corados dos colonos europeus.
Mas nem para os primeiros europeus do Paraná faltou uma boa dose de aventura.
Atravessar o Atlântico foi só o começo para italianos, alemães, ucranianos, poloneses e, já na segunda metade do Século 20, holandeses, os prósperos "novatos" nas levas de imigrantes. (O estado também tem uma significativa colônia japonesa).
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Casa de colonos poloneses no Parque Histórico do Iguassu |
A estranheza com a nova terra, as privações, a ajuda do governo que não veio (apesar da propaganda das empresas recrutadoras de colonos), a fome e as doenças foram a realidade cotidiana dos pioneiros entre os imigrantes que chegaram ao Paraná.
Uma das histórias mais tocantes é a do farmacêutico brasileiro Antiocho Pereira, que, cansado do descaso oficial, vendeu a casa e a farmácia para comprar remédios para uma comunidade polonesa assentada no município de Cruz Machado e acossada por uma epidemia de tifo, por volta de 1920. Antes da intervenção de Antiocho, 900 colonos já haviam morrido.
Uma das histórias mais tocantes é a do farmacêutico brasileiro Antiocho Pereira, que, cansado do descaso oficial, vendeu a casa e a farmácia para comprar remédios para uma comunidade polonesa assentada no município de Cruz Machado e acossada por uma epidemia de tifo, por volta de 1920. Antes da intervenção de Antiocho, 900 colonos já haviam morrido.
⭐Parque Histórico Iguassú
Essa reserva de 240 mil metros quadrados de mata é dedicada à memória da região Centro-Sul Paranaense fica a 29 km do centro de União da Vitória.
Imigrantes, tropeiros e a Guerra do Contestado são as estrelas de um roteiro talvez excessivamente cenográfico, mas tocado com muita paixão por Joana e Dago Wohel.
A área fica à beira do lago da usina de Foz do Areia e oferece passeios de barco (R$ 98 por pessoa) para a apreciação de algumas quedas d’água.
A principal atração é mesmo o farto almoço servido no local e as construções de madeira originais, feitas por colonos, transplantadas peça por peça, cuidadosamente numeradas e que consumiram, cada uma, cerca de um ano, na remontagem, como conta Joana Wohel.
O moinho polonês ainda funciona e as casas polonesa, ucraniana e alemã podem ser alugadas por hóspedes. A casa polonesa, com 103 anos de idade, pode abrigar mais de 20 pessoas e o aluguel para grupos custa entre R$ 320 e R$ 990.
Imigrantes, tropeiros e a Guerra do Contestado são as estrelas de um roteiro talvez excessivamente cenográfico, mas tocado com muita paixão por Joana e Dago Wohel.
A área fica à beira do lago da usina de Foz do Areia e oferece passeios de barco (R$ 98 por pessoa) para a apreciação de algumas quedas d’água.
O moinho polonês ainda funciona e as casas polonesa, ucraniana e alemã podem ser alugadas por hóspedes. A casa polonesa, com 103 anos de idade, pode abrigar mais de 20 pessoas e o aluguel para grupos custa entre R$ 320 e R$ 990.
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Passeio de barco no Rio Iguaçu |
União da Vitória fica a 240 km de Curitiba. Para agendar uma visita ao Parque Histórico do Iguassu, ligue para (42) 3523-1515.
Estive em União da Vitória e na Lapa a convite da Cooperativa de Turismo do Paraná- Cooptur. O conteúdo do post, porém, reflete a minha opinião, formada a partir da experiência com o roteiro e os serviços testados ao longo da viagem.
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