30 março 2006

O melhor presente do mundo: aniversário em Paris

Pont Neuf em Paris
A Pont Nuef e aquela luz que só existe em Paris

Música deste post: Feeling Alright, Joe Cocker

Já que o envelhecer é inexorável, façamo-lo com estilo: adoro passar aniversário em Paris. Finalzinho de março, tempinho frio, cidade mais vazia... Perfeito.

Bulevar Saint-Michel em Paris
O Boulevard Saint-Michel (esq), foi meu vizinho de porta nessa temporada no Quartier Latin 

É no comecinho tímido da primavera que Paris se apresenta como o cenário exato pra que eu caminhe distraída, namore as fachadas do Marais e os tabuleiros dos bouquinistes à beira do Sena e brinque de figurante em meu filme da Nouvelle Vague.

Tempo bom pra devorar livros e mais livros nas mesas dos cafés ou num banco de praça (de preferência, onde bata sol).

Passeio de barco pelo Rio Sena em Paris
Rio Sena em Paris
Antiquário de Montmartre em Paris

Duas coisas que eu não dispenso num um roteiro em Paris: passeio de barco pelo Rio Sena (adoro ver a cidade desfilar pra mim) e namorar as lojas e antiquários em Montmartre


Meu aniversário em Paris em 2006 foi assim. O verbo era flâner: reservei três semanas de folga para vir fazer rigorosamente nada na cidade, exceto o que desse vontade.

Com todo o direito à preguiça e a recusar programas que podem até “contar para o currículo”, mas que não me acrescentariam nada no capítulo prazer.

Por exemplo, dar meia volta, na porta do museu, se a fila estivesse grande. Ou gazetear o almoço no bistrô descolado para devorar um pacote de macarrons da Ladurée...

Ponte Notre Dame em Paris
Caminhar sem compromisso por Paris é um prazer indescritível. Na imagem, a Pont Notre Dame, que liga a Île de la Cité à Rive Droit, a margem direita do Sena
Palácio da Justiça em Paris
Sainte Chapelle em Paris
Sainte Chapelle em Paris
O Palácio da Justiça (no alto) guarda um dos mais belos tesouros de Paris, a Sainte Chapelle 

Essa rebeldia inclui até fazer coisas que a gente sabe que não deve. Como me hospedar no Quartier Latin, com seus hotéis de quartos minúsculos e preços inflacionadíssimos - fortes candidatos ao título de pior relação custo/ benefício do planeta.

Mas encasquetei. E a hospedagem no Quartier Latin tem lá suas vantagens: começar o dia lendo o jornal no jardim do Hôtel de Cluny, um cantinho que adoro (com acesso gratuito), e visitar muuuuitas vezes as tapeçarias da Dama e o Unicórnio, expostos no Museu Nacional da Idade Média, que funciona lá.

Jardim de Cluny em Paris
Jardim de Cluny em Paris
O Jardin de Cluny, no Quartier Latin, recria um jardim medieval e tem acesso gratuito
Hôtel de Cluny em Paris
Hôtel de Cluny em Paris
Museu Nacional da Idade Média em Paris
O Jardin de Cluny, no Quartier Latin, recria um jardim medieval e tem acesso gratuito

E tem coisa melhor do que a certeza de que a última visão de Paris, todas as noites, será a beira do Sena, com Notre Dame de um lado e Pont Neuf do outro?

Paris tem museus espetaculares, lojas escandalosas, restaurantes indescritíveis. Mas Paris, pra mim, é andar na rua. 

E andar na rua é constatar que as francesas conhecem 417 formas de amarrar uma echarpe, 325 jeitos de levantar a gola do casaco e pelo menos 218 maneiras de puxar uma mecha de cabelo para trás da orelha. Não dá pra competir...

Banca de livros usados em Saint Germain-des-Prés em Paris
Banca de livros usados em Saint Germain-des-Prés

Andar na rua em Paris é me apaixonar a cada passo. Por vitrines, fachadas e detalhes. É garimpar um livrinho, nas eternas pilhas expostas nas calçadas.

É, principalmente, encontrar referências: uma rua por onde transitou um personagem, uma placa que sinaliza a antiga morada de um poeta ou homenageia um combatente da Resistência.

Torre João sem medo em Paris
A Torre Jean-sans-Peur (“João sem medo”) data de 1409 e é o último vestígio do palácio dos Duques da Borgonha em Paris. Ela é aberta à visitação e apresenta exposições sobre a vida na Idade Média. Fica quase em frente à estação de metrô Étienne Marcel
Homenagem a Joana D'Arc na Rua Sain-Honoré em Paris
Em 1429, Joana D’arc foi ferida no assalto por uma flecha no assalto à Porta de Saint-Honoré, principal acesso na muralha de Paris na direção Oeste. Esta placa na altura do º 163 da Rue de Saint-Honoré relembra o episódio
Casas medievais no Quartier Latin em Paris
Apesar das reformas radicais do Barão Hausmann, ainda é possível encontrar construções medievais em Paris. Estas ficam no Quartier Latin, na esquina da Rua Galande com a Rua Saint-Jaques
Bairro do Maris em Paris
Bairro do Maris em Paris
Qualquer caminhada pelo Marais é o paraíso pra quem gosta de garimpar detalhes. O bairro é um dos mais antigos de Paris e preserva um belíssimo acervo arquitetônico
Bairro do Maris em Paris
Hotel de Châtillon, na Rua Payenne nº 13, no Marais
O Hôtel de Lamoignon é pontado como a construção mais preservada do Século 16 em Paris. Hoje, é sede da Biblioteca Histórica da Cidade e seus jardins são abetos ao público. Fica na Rua Rue des Francs Bourgeois nº 25, no Marais

Andar na rua em Paris é também olhar os franceses, que devem aprender no Jardim de Infância aquele jeito de inclinar a cabeça, a la Belmondo.

Junte tudo isso a uma casquinha de sorvete de framboesa da Berthillon e a felicidade está completa...

Place des Vosges em Paris
Place des Vosges em Paris
Place des Vosges em Paris
Eu amo a Place des Vosges
Place des Vosges em Paris
Em uma ponta da Place des Vosges fica a estátua equestre de Luís XIII (1601-1643), o rei que todo mundo conhece de Os Três Mosqueteiros

Mas este aniversário aniversário em Paris não foi só flanar. A França estava ardendo. No dia em que cheguei, ainda encontrei os vestígios da imensa manifestação da véspera.

Mais de 130 cidades tiveram marchas inflamadas contra a chamada Lei do Primeiro Emprego, uma tentativa do governo conservador de Dominique de Villepin de flexibilizar direitos trabalhistas, a pretexto de “facilitar” o acesso dos jovens ao mercado de trabalho.

Jardins do Palais Royal em Paris
Jardins do Palais Royal em Paris
O sossego reina nos Jardins do Palais Royal. A área fica meio escondida entre construções, do ladinho do Museu do Louvre

A greve foi forte, paralisou diversos serviços, afetou o tráfego aéreo e os transportes públicos. Mas no dia seguinte, quando desembarquei em Paris, estava tudo de volta ao normal.

Meu voo pousou no horário e não tive dificuldades de pegar o RER do Aeroporto Charles de Gaulle até o centro — quer dizer, não tive mais dificuldades que o normal, porque aquele trem lotado, com mala, ninguém merece...

Hôtel de Sully em Paris
O Hôtel de Sully é um belíssimo palácio do Século 17 que agora abriga o órgão responsável pelo patrimônio histórico francês. Os jardins estão abertos ao público. Ele fica na Rua de Sainte-Antoine nº 62, no Marais
Square du Temple em Paris

Mudei de hotel do Quartier Latin para o Marais e fiquei do ladinho da Square du Temple, jardim adorável na Rue de Bretagne, no Marais. Era lá que eu começava o dia com um café, frutinhas e um croissant, comprados no Marché des Enfants Rouges, que é vizinho. A praça ocupa o local da antiga fortaleza dos Cavaleiros Templários 


Tinha gente comparando essas mobilizações de 2006 em Paris às famosas barricadas de 1968. Descontado o grande exagero, foi mesmo impressionante ver a quantidade de gente nas manifestações realizadas durante minha estadia na cidade.

Eu amei, claro. Jornalistas são bichos estranhos, mais confortáveis na turbulência que na calmaria.

Passeio à beira do Rio Sena em Paris
Passeio à beira do Rio Sena em Paris
Passeio à beira do Rio Sena em Paris
Passeio à beira do Rio Sena em Paris
Passear às margens do Sena é um dos grandes programas de Paris

O fato é que Paris me pareceu muito mais viva, desde que cheguei do aeroporto, emergindo do buraco de metrô no mesmo Boulevard Saint Michel celebrizado por aquela primavera lá de 68, tempo em que as pessoas eram realistas e reivindicavam o impossível, como ensinava uma célebre pichação. 

Em tempo: cerca de 10 dias, inúmeras manifestações e mais duas jornadas de greve geral após a minha chegada, o governo francês recuou e retirou a proposta da Lei do Primeiro empregos. Eu recebi a notícia em Amsterdã, pra onde tinha dado uma escapadinha de quatro dias, e comemorei  um bocado. 

Confeitaria Ladurée em Paris

Fachada Belle Époque da Confeitaria Ladurée, na Avenida de Champs-Élysées


Endereços
Museu Nacional da Idade Média (Musée National du Moyen Age) - Musée de Cluny- 6 place Paul Painlevé. Das 9:15h às 17:45h (fecha às terças). Entrada: 8,50 €

Berthillon- 29-31 Rue Saint Louis en l'Ile.

Ladurée - A matriz fica no nº 75 da Avenue des Champs-Elysées. Confira outros endereços no site.

Todas as dicas de Paris

França na Fragata Surprise


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