Nem a neve, que surpreendeu todo mundo, esfriou a
alma blueseira de Memphis. Na imagem, Beale Street, a rua do Blues |
E que cidade é essa Dona Memphis! Contraditória, segregada, problemática, sem grandes paisagens para selfies... E foi ela quem mais arrebatou meu coração durante meu roteiro musical pelos Estados Unidos — e olha que as outras paradas foram em Nova Orleans e Nashville.
Pois eu arriei de quatro pneus pela cidade do Blues. Se você gosta de música, vai encontrar muito o que fazer em Memphis. Se não gosta tanto, acho que nem assim vai escapar imune.
A primeira coisa que você vai fazer em Memphis (e repetir obsessivamente) é ouvir música.
Vai bater ponto três vezes por dia em Beale Street, legendária “5ª Avenida” da comunidade afro-americana da cidade em tempos idos, hoje passarela de bares e clubes com shows — e que shows! — ao vivo. (A música em Beale Street ganhou um post exclusivo).
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A fábrica das legendárias guitarras Gibson está se
despedindo de Memphis. E o que importa? Os guitarristas — com Gibsons e
Fenders — continuarão chegando aos montes pra mostrar sua arte |
E, lá pras tantas, vai mandar tudo às favas e dançar com gosto e sem vergonha — mesmo quando a música estiver tocando só na sua cabeça.
O que você mais vai fazer em Memphis é se apaixonar por ela. Vai morrer de amor por essa cidade paradoxal, posta no mapa pelo engenho e pela arte de um povo segregado ao gueto, pioneira na conquista de escolas públicas para crianças negras.
O que fazer em Memphis
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Inaugurado em 1928, o Orpheum Theater já recebeu gênios de
todos os estilos em seu palco |
Para calendário de apresentações, acesse o site do teatro
Foi inaugurado em 1928, substituindo outra casa de espetáculos, a Grand Opera House — que tinha uma natureza menos afinada com a alma Blues da cidade —, incendiada em 1923.
Em pompa e em beleza, porém, o Orpheum Theater não destoa de uma grande casa de ópera de inspiração Belle Époque (esses teatros que me matam de paixão, vocês já sabem).
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Vocês já sabem como em adoro um teatro bonitão |
Tem decoração suntuosa, com entalhes delicados nas madeiras nobres, mármores e candelabros de cristal no saguão, veludos vermelhos, como é de rigueur...
O repertório do teatro é bastante variado: concertos eruditos, balés, shows de música popular e, para orgulho de Memphis, vários espetáculos da Broadway, que podem ser montados sem qualquer problema, graças às dimensões do palco e à qualidade dos equipamentos do Orpheum.
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Encontrei vários amores da minha vida a Calçada da Fama do
Orpheum Theater |
O Orpheum Theater não oferece visitas guiadas. Para ver sua beleza, eu fiz o sacrifício (😀😀) de assistir à apresentação de Joe Bonamassa, que, pra minha sorte, tocou em Memphis em uma das noites que eu estava na cidade.
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Bonamassa no palco: quem teve um mestre como BB King só
podia ser fera (e desculpem o flood, mas eu sou fã) |
Gosta de música e viagens? Siga o link para mais dicas 😉
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Michael Rhodes, um super baixista para um guitarrista genial |
Fiz um post bem detalhadinho sobre a compra de ingressos para espetáculos nos EUA.
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A lembrança do bluesman Little Milton (1934-2005) recebe os
visitantes na porta do Hall da Fama do Blues |
Diariamente, das 10h às 17h. Entrada: US$ 10
Cinco minutos depois de entrar no Museu do Blues Hall of Fame, eu já tinha certeza absoluta de que tinha ido para o céu sem sequer precisar me dar ao trabalho de morrer.
Que museu, gente! Que museu!!!
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Artistas dos pincéis homenageiam os gênios dos 12 compassos
nesta galeria instalada no saguão do Hall da Fama do Blues |
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Poderosamente simples: imagens e painéis explicativos
levam o visitante pela mão no Museu do Hall da Fama do Blues |
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Pioneiros do Blues no Delta do Mississípi: Charley Patton
(esq), considerado o "pai" desse estilo, e Tommy Johnson, menestrel
blueseiro dos anos 20 |
O acervo musical do museu do Blues Hall of Fame é imenso e maravilhoso. Ele é apresentado ao público de forma super didática e agradável.
As telas interativas de cada módulo guiam o visitante pelas informações biográficas e musicais dos artistas e depois nos levam pela mão para um delicioso tour pelos registros sonoros dos gênios e gênias do Blues. Dá pra ficar horas navegando naquele som inebriante.
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Fiquei tão empolgada com o museu que rolou até um discreto autorretrato
num vinil com a gravação de Key to the Highway, por Big Bill Broonzy |
Dá pra passar o dia inteiro lá dentro — eu fiz quase isso — e acordar na manhã seguinte com muita vontade de voltar.
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Essas telinhas são a chave para o paraíso: você escolhe o
que ouvir e ainda lê histórias bacanas sobre as canções e seus autores e
intérpretes |
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E o museu ainda tem uma sala de leitura, pra quem quiser
aprender mais |
Naquele ano de fundação, 20 grandes nomes foram introduzidos no Hall da Fama do Blues (entre eles Big Bill Broonzy, John Lee Hooker, Howlin' Wolf, Robert Johnson, B.B. King, Muddy Waters, Charley Patton, Bessie Smith e os dois Sonny Boy Williamson).
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No alto, uma Lucille (guitarra) de BB King (no alto). Acima,
lembranças de Johnny Winter |
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Muddy Waters em cena: a jaqueta da turnê de 1982 e um violão
usado por ele |
Até 2018, são 213 homenageados.
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O Hall da Fama do Blues: cadê Rory Gallagher, moço? |
Conversando com membros da Blues Foundation, mantenedora do Hall da Fama, cobrei enfaticamente uma homenagem a Rory Gallagher (aquele irlandês que Jimmi Hendrix achava o melhor guitarrista do mundo).
E bora combinar que já passou da hora de colocarem Jimmi Hendrix e Janis Joplin na lista 😊.
O museu do Blues Hall of Fame funciona desde 2015 e é uma das atrações imperdíveis de Memphis. Quando passar pela cidade, não perca esse visita por nada deste mundo.
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Rock'n'Soul Museum, porque contexto é bom e eu gosto |
191 Beale Street
Aberto diariamente das 9:30h às 19h. Ingresso: US$ 13.
Se não ficasse na mesma cidade onde estão Graceland, o Sun Studio e o museu do Blues Hall of Fame, o Rock’n’Soul Museum seria muito comentado do que é — e mesmo comparado com essa trinca espetacular de concorrentes, continua sendo uma visita imperdível em Memphis.
Aliás, não só recomendo que você vá mesmo ao Rock’n’Soul Museum como sugiro que comece a explorar as atrações de Memphis por lá.
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Recuerdos de Carl Perkins, um gênio do Rock'n'Roll |
Nesse capítulo, o museu é imbatível. É lá que o visitante pode conhecer melhor a realidade rural do Sul dos Estados Unidos, especialmente da área do Mississipi, no início do Século 20.
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No universo doméstico de uma família negra no Sul dos EUA,
nos anos 30, havia pouquíssimas posses. Mas a música estava lá |
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Numa vida de pobreza e exploração, a música era o lazer
depois da lida no campo e presença obrigatória nos ofícios religiosos, ao som
do órgão da igreja |
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O "contrabalde" era um contrabaixo de uma corda
só, improvisado com um balde e um cabo de vassoura |
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Quando as guitarras elétricas chegaram ao mundo do Blues, o
volume era sempre no talo, impondo a música sobre o burburinho urbano |
E a dureza só piorou com o crack da Bolsa de Valores, em 1929, e com os longos anos da Grande Depressão Econômica.
Esse cenário econômico inspirou o grande êxodo do Delta do Mississipi para as cidades industrializadas do Norte. O Blues migrou na bagagem dos foragidos da fome. Essa mesma realidade também gestou os legendários andarilhos que inspirariam a Literatura Beat, a Cultura Beatnik e o Movimento Hippie, em décadas seguintes.
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Claro que tem Elvis no Rock'n'Soul Museum. Acima, uniforme
usado pelo rei quando estava no Exército |
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Uma das sessões mais interessantes do Rock'n'Soul Museum
lembra o papel desempenhado pela música na luta pelos Direitos Civis |
Um ponto arrepiante do Rock’n’Soul Museum é dedicado ao papel da música no Movimento pelos Direitos Civis, a partir dos anos 50.
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O Sun é um estúdio, mas pode chamar de catedral |
⭐Sun Studio
Aberto diariamente das 10h às 18:15h. Só recebe visitas guiadas, iniciadas de hora em hora. Ingressos: US$ 14.
O estúdio do mago Sam Phillips, inaugurado em 1950, foi um engenho incessante de gravações de Blues e Country desde sua origem. Gente como os blueseiros Howlin' Wolf, Little Milton e BB. King eram habitués da casa.
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Em 1987, o Sun Studio foi reaberto em sua sede original, a 1
km do Centro de Memphis |
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A placa lembra a relação de Elvis com o Sun Studio, onde ele fez sua primeira gravação e produziu a alquimia do Country com o Blues em That's alright, Mama |
Dizem que o primeiro registro de Rock’n’Roll feito no Laboratório do Doutor Phillips — e no planeta — foi a canção Rocket 88, gravada por Jackie Brenston and his Delta Cats.
Mas “quando a lenda vira realidade, publique-se a lenda”, já dizia aquele personagem de John Ford. E a lenda, meus caros navegantes desta Fragata, chama-se Elvis Aaron Presley.
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Na entrada do Sun Studio funciona um café. A foto na parede
é do "Quarteto de 1 milhão de dólares" — Elvis, Johnny Cash, Carl
Perkins e Jerry Lee Lewis, que gravaram juntos no estúdio em 1956 |
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Ninguém resiste às singelas lembrancinhas à venda no café do
Sun Studio |
Em um belo (belíssimo) dia de 1953, o jovem Elvis Presley apareceu no Sun Studio para gravar um disco e dar de presente à mãe.
O céu não se abriu nem soaram trombetas: Elvis foi pra casa com seu vinil quase doméstico da canção My Happiness e isso teria sido o fim da história, se a secretária de Sam Phillips, Marion Keisker, responsável pela gravação, não tivesse anotado que o cara era “um bom cantor de baladas”.
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O dono da casa, Sam Phillips e equipamento original usado
por ele nas gravações |
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Réplica do estúdio de rádio de Phillips, que também era
disc-jockey |
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O escritório de Marion Keisker, a descobridora oficial de
Elvis Presley, ficava coladinho ao estúdio de gravação |
Essa cena do Genesis se deu meio por acaso: Elvis não tinha banda e arrebanhou dois amigos que tocavam Country para acompanhá-lo numa sessão no Sun Studio.
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A coleção de relíquias e lembranças do Sun Studio está no
roteiro da visita guiada |
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Violão encapado em couro de vaca — mais Country, impossível
— que pertenceu a Elvis |
E foi assim que o Blues That's All Right (Mamma) ganhou a batida que fundia a música caipira dos brancos com o som rural dos negros daquele jeito tão univitelino.
Dessa faísca primordial veio um rastilho de explosões cósmicas: aquele microfone do Sun Studio (que aparece comigo na foto mais abaixo) gravou vozes como as de Johnny Cash, Carl Perkins, Roy Orbison, e Jerry Lee Lewis — só pra ficar entre habitantes do Olimpo.
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O interior do estúdio de gravação: aquele pianinho ali é o
mesmo tocado por Elvis no encontro do Million
Dollars Quartet |
O Sun Studio fica um pouquinho afastado do Centro de Memphis, a cerca de 1 km do miolo de Beale Street (veja no mapa abaixo).
O mesmo micro-ônibus que vai do Rock'n'Soul Museum pra Graceland faz uma parada lá e essa é a maneira mais confortável de chegar ao Sun Studio.
Eu preferi ir a pé e foi uma caminhada tranquila e segura. Outra possibilidade é pegar o bonde da Linha de Madison Avenue, que tem uma parada próxima ao estúdio.
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Adorei a visita a Graceland, a casa de Elvis em Memphis |
⭐Graceland
Aberto diariamente, das 9h às 16h. Ingressos a partir de US$ 41.
O túmulo de Elvis pode ser visitado gratuitamente, das 7:30h às 8:30h.
Graceland foi a casa de Elvis Presley durante 20 anos. A propriedade foi comprada em 1957, quando ele estava bombando nas paradas de sucesso e nas telas de cinemas.
Desde 1992, Graceland está aberta ao público e é a segunda residência mais visitada dos EUA, atrás apenas da Casa Branca.
As 650 mil pessoas que passam pelo refúgio de Elvis todos os anos podem percorrer a maioria dos ambientes da mansão (o segundo andar é fechado à visitação).
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Graceland guarda as memórias de um Elvis doméstico e do
ídolo do Rock’n’Roll |
Elvis está sepultado em Graceland, no Jardim da Meditação, que era seu lugar favorito na propriedade. Ao lado de seu túmulo estão as sepulturas de sua avó Minnie, e de seus pais Vernon e Gladys.
A casa de Elvis é uma visita para o dia inteiro. O melhor jeito de chegar lá é com o micro-ônibus que sai do Rock’n’Soul Museum, no Centro de Memphis.
Graceland ganhou um post exclusivo: Graceland, a casa de Elvis Presley em Memphis
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Quem ama o Blues e o Rock'n'Roll precisa conhecer a luta do
povo que forjou esses acordes. O Museu Nacional dos Direitos Civis é
emocionante |
⭐Museu Nacional dos Direitos Civis
450 Mulberry Street.
De quarta a segunda, das 9h às 17h. Entrada: US$ 16.
O Museu Nacional dos Direitos Civis ganhou um post só pra ele aqui na Fragata. Passa lá pra ver 😊.
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A passeata dos patos (pé de pato, mangalô três vezes) e, à direita, o Hotel Peabody visto da janela do meu quarto em Memphis |
⭐Parada dos patos do Hotel Peabody
Essa atração de Memphis que eu acabei perdendo — bastante de propósito, aliás. Afinal, essa história de patos fazendo passeata escangalhou com o Brasil, né?
É uma tradição de mais de 90 anos, iniciada em uma bebedeira: o gerente do Peabody voltou de uma caçada em águas e achou engraçado colocar uns patos para nadar na fonte do hotel. O sucesso foi tanto que a gracinha passou a ser repetida diariamente, para alegria dos hóspedes.
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Oi, Cyntia. Tudo bem? :)
ResponderExcluirSeu post foi selecionado para o #linkódromo, do Viaje na Viagem.
Dá uma olhada em http://www.viajenaviagem.com
Até mais,
Bóia – Natalie
Vc é o máximo. Em outubro irei a Memphis, muitíssimo Obrigada das dicas.
ResponderExcluirDa pa vc me responder onde vc comprou o passe para ir em Grecyland, e um etc...? E esse passe da direito a ver os macacões de Elvis?
Oi, o ingresso combinado pode ser comprado na bilheteria de qualquer uma das quatro atrações (Sun Studio, Graceland, Rock'n'Soul Museum e Stax Museum).
ExcluirO mais fácil é comprar no Rock'n'Soul Museum, que fica bem no centro de Memphis, numa esquina da Beale Street, pois assim você já terá o direito de usar o micro-ônibus que leva a todas essas atrações.
Há várias modalidades de ingressos para Graceland (detalhes aqui > https://www.fragatasurprise.com/2019/03/graceland-casa-de-elvis-presley-em.html). Tem ingressos para ver só a mansão, outros que combinam a mansão com os museus (onde estão os macacões, carros e mais uma infinidade de objetos) e os aviões de Elvis.
Aproveite Memphis. Eu tô louca pra voltar lá.