O que fazer em Florença

O cair da tarde às margens do Rio arno, em Florença, tem uma rara magia

Poucos lugares no mundo exercem tanto fascínio sobre os viajantes quanto Florença. Ela está nos filmes, nos livros e na fantasia de quase todo mundo, inspirando sonhos, planos e expectativas. E a cidade corresponde, generosamente, a tudo que se antecipa dela.

Florença tem tesouros por toda parte, belezas indescritíveis, referências que nos acompanharam a vida toda e que, de repente, estão ali, de cara lavada, diante de nós.

A Igreja de Orsanmichele chama a atenção pela elaboradíssima fachada. Ela foi originalmente um mercado, transformado em espaço religioso no comecinho do Século 15 para servir como local de culto aos integrantes da guilda de comércio de Florença

Isso é ótimo, mas também pode transformar a visita à capital da Renascença numa angústia permanente de querer “ver tudo”. E tem muito o que fazer em Florença pra que a gente consiga esgotá-la em uma primeira visita, ainda mais se forem poucos dias.

O Palazzo Vecchio foi a sede do governo de Florença na Idade Média e no Renascimento

Minha primeira passagem por Florença foi uma experiência contraditória. Amei tudo o que vi, mas fui embora com a certeza de que dois dias são muito pouco tempo para uma cidade com tantas maravilhas. A frustração pelo que não vi empanava um pouco as minhas memórias.

Com mais tempo em Florença, a gente descobre o prazer de andar à toa, descobrindo ruas anônimas e o uma porção de cotidiano que dá ainda mais encanto à cidade

Pra isso não acontecer com você, listei aqui alguns programinhas básicos de Florença e já vou avisando: essa não é uma cidade pra dar "só uma passadinha". Veja as dicas:

O que fazer em Florença

Florença é linda até debaixo de um toró

Na segunda vez que estive em Florença, dediquei cinco dias inteirinhos para um lento e desestressado tête-à-tête com a cidade.

Revi as grandes atrações, mas também pude andar à toa, descobrindo ruas anônimas, fachadas e pátios encantadores, ainda que sem pedigree — se é que alguma coisa nessa cidade cheia de história pode ser enquadrada nessa categoria.

O Batistério de Florença (em primeiro plano), o Campanário de Giotto, o Duomo e sua Cúpula de Bruneleschi: nunca uma algaravia de linhas e detalhes foi tão harmônica

Num lugar tão cheio de maravilhas, é essencial alternar os momentos mais tcharaaaaan com programinhas despretensiosos, para impedir que o excesso de beleza e informação sature nosso olhar e nossa sensibilidade.

Acho que cada visitante merece descobrir Florença ao seu modo. Mas como algumas dicas sempre são importantes, fiz uma listinha de coisas que curti por lá. Use como inspiração, mas não deixe de criar suas próprias trilhas pela cidade.

Bem pertinho das principais atrações, a Piazza San Marco é sempre um lugar sossegado para uma pausa. No interior do convento (ao fundo) estão preciosos afrescos de Fra Angelico

⭐ Pedalar em Florença

Experimente Florença de bicicleta

Um dos meus melhores momentos em Florença foi um passeio de bicicleta, saindo das imediações de San Lorenzo, passando pela Piazza della Signoria, atravessando para Oltrarno pela Ponte delle Grazie e percorrendo a beira do Arno, para voltar ao centro de Florença por Santa Croce.

Florença não é Amsterdã, mas dá bem certinho com os pedais. Eu adorei

Pedalando e pensando na vida, sem a obrigação de "absorver", "decorar", sem consciência de estar contemplando tanta beleza, descobri um encanto ainda maior.

⭐ Explorar Otrarno

"O outro lado" do Rio Arno, acessível por diversas pontes, entre elas a famosa Ponte Vecchio, rende ótimas caminhadas.

Fontana dello Sprone, do Século 17, em Oltrarno

Não se sabe ao certo a idade da Torre dei Marsili, mas já havia registros de sua existência no Século 13. A decoração em cerâmica esmaltada, típica da Toscana, representa a Anunciação e foi acrescentada no Século 15

Além do Palazzo Pitti e dos Jardins de Boboli, essa parte da cidade tem inúmeras ladeirinhas e becos cheios de fachadas lindas.

Outros encantos imperdíveis de Oltrarno são à belíssima Basílica de San Miniato al Monte, o Giardino delle Rose (Jardim das Rosas) e, naturalmente, a famosa Piazzale Michelangelo.

⭐ Procurar a "vida normal" no bairro de Santa Croce

Essa foi uma descoberta que fiz na minha visita anterior à cidade: pertinho da área da Galleria degli Uffizi, que está sempre lotada, a região em torno da Basílica de Santa Croce tem um astral muito menos turístico.

E olha que a Basílica de Santa Croce é uma magnífica igreja, lotada de obras de arte e abrigo de nada menos que os túmulos de Michelangelo, Galileu Galilei, Maquiavel e Rossini (também há um túmulo de Dante Alighieri lá, mas está vazio. O corpo do poeta está sepultado em Ravena, onde ele morreu, exilado de Florença). 

Mas a marca mais forte que me ficou de Santa Croce foram mercadinhos, barracas de frutas e hortaliças montadas na rua e uma cara de "vida normal" sitiada por maravilhas. 

Ensaio para a Festa degli Omaggi, em frente à Basílica de Santa Croce

Numa das minhas visitas à praça, dei de cara com um grupo ensaiando para a Festa degli Omaggi ("Festa da Homenagem"), realizada na época do Natal, no dia 20 de dezembro. O cortejo em trajes medievais celebra a República Florentina.

Já com o figurino do dia da apresentação, o grupo fazia malabarismos com bandeiras, ao ritmo dos tambores, numa cena que a gente associa ao Pálio de Siena.

Poucas coisas dão mais cara de vida normal a um lugar do que uma barraca de hortaliças na rua, né?

Túmulo de Galileu Galilei na Basílica de Santa Croce

Mesmo em novembro, a oferta de frutas frescas nas bancas dos mercadinhos lembra um cenário tropical. E sempre haverá uma ou muitas mammas abastecendo a despensa por lá, como as que me socorreram, aflitas, quando o retrovisor de uma van tirou tinta da minha orelha esquerda — o astral era tão relaxado que eu esqueci de prestar atenção aos carros.

Só não deixe de entrar na Basílica de Santa Croce para render homenagem aos ilustres italianos sepultados lá e para ver o interior gótico — impossível não se comover com a Anunciação, de Donatello, principal atração da igreja.

Saiba mais sobre esta basílica e a igualmente linda Santa Maria Novella neste post:
A igrejas de Santa Croce e Santa Maria Novella

Basílica de Santissima Annunciata (ao fundo) e o Ospedali degli Innocenti (à direita). A estátua representa Ferdinando I de Medici, grão-duque da Toscana no Século 16

⭐ Piazza Santissima Annunciata

Atrás da Accademia (casa do Davi de Michelangelo), a Praça da Santissima Annunciata tem uma bela basílica do Século 13, projetada por Michelozzo, que tem forte papel na vida espiritual da cidade. A entrada é gratuita e juro que você não vai se arrepender da visita.

Ao lado da igreja fica o interessante Ospedali degli Innocenti, um orfanato do Século 15 projetado por Bruneleschi.

Ospedali degli Innocenti, projetado por Bruneleschi

Na fachada do orfanato, relevos de terracota, em fundo azul, mostram umas criancinhas que eu sempre achei meio macabras, enroladas em cueiros, à moda da época.

Mais detalhes: Igrejas de Florença com entrada gratuita

⭐ Ver o pôr do sol das pontes sobre o Rio Arno

Essa é a hora mágica de Florença, quando a cidade fica toda dourada e parece uma miragem. Um dos melhores camarotes da cidade para ver esse espetáculo é a cabeceira da Ponte Santa Trinitá.

Ela é a primeira a Leste de Ponte Vecchio e oferece uma vista privilegiada para a sua colega mais famosa. De Oltrano, o olhar fica mais alinhado com a caída do sol, que vai fazendo Ponte Vecchio mudar de cor. Acredite, é pura sedução.

Se você só tiver um pôr do sol em Florença, pode apostar que vai querer vê-lo da Piazzale Michelangelo

O pôr do sol mais famoso de Florença é o visto da Piazzale Michelangelo. A praça fica no alto da colina que domina Oltrarno. Tem uma réplica do Davi, centenas de vendedores de bugigangas e um estacionamento apinhado de ônibus de turismo. Não ligue.

Mas também vale escolher uma ponte pra chamar de sua e assistir ao entardecer às margens do Rio Arno. Repare em Ponte Vecchio ao fundo (à esquerda). Na ponta direita, a Galleria degli Uffizi e o Museu Galileu Galilei

Escolha um cantinho na balaustrada e delicie-se com a vista lá em baixo: a cidade inteirinha, o Arno, as pontes, os campanários e as cúpulas. GoogleEarth ao vivo. Pode ter sido coincidência, mas nas duas vezes que fui a Florença havia uma bruma insistente que subia do rio e, no cair da tarde, dava um tom ainda mais mágico à paisagem vista lá de cima.

A tarde caindo sobre o Campanário de Giotto e a Cúpula de Bruneleschi é uma imagem inesquecível. A foto foi feita do terraço da Galleria degli Uffizi

Há três maneiras de chegar a Piazzale Michelangelo. A chata é ir com ônibus de excursão. A penosa é subir a pé. Escolha a prática: em Oltrarno, pegue um dos muitos ônibus que passam pela beira do rio e sobem até lá. Há também as linhas de ônibus 12 e 13, que Partem da Estação de trens Santa Maria Novella. Os horários e itinerários também podem ser consultados no site da ATAF.

Por fim, uma senhora mesa de pista para ver a tarde cair é o terraço da Galleria degli Uffizi. Mais perto das maravilhas, misturado a elas, o olhar da gente fica mais íntimo e mais cúmplice da luz que vai tingindo a cidade. Lindo de fazer o coração dar uma paradinha...

Museus de Florença

Super recomendo a visita ao Palazzo Vecchio

⭐ Galleria degli Uffizi 

Nem sei se esse é o maior, mas, com certeza é o mais icônico dos acervos de telas renascentistas do planeta. É daqueles lugares que a gente tem que ir ao menos uma vez na vida. Por isso mesmo, não é um lugar fácil de visitar.

Machiavel recebe os visitantes na entrada da Galleria degli Uffizzi

Em pleno mês de novembro, baixa temporada, a fila na entrada era programa para pelo menos duas horas de espera. Lá dentro, sempre haverá hordas de visitantes — nem todos comovidos com a beleza sublime das obras expostas.

Tenha um pouquinho de paciência com as turmas barulhentas, com os guias de excursão que "monopolizam" algumas salas com longas explicações para seu grupo (não sei você, mas o barulho afeta terrivelmente o meu prazer da contemplação).

Confira minha estratégia de sobrevivência pra visitar a Galleria degli Uffizi e ver obras-primas como o Retrato de um Jovem com Barrete Vermelho, de Lorenzo di Credi

Mas não se desanime. Monte uma estratégia de sobrevivência nos museus de Florença.

Por exemplo, compre o ingresso com hora marcada e escolha os primeiros horários, para entrar logo na abertura do museu. A entrada com hora marcada pode representar a economia de umas duas horas de fila, pelo menos.

Mais detalhes: Museus de Florença - Uffizi e Accademia

O reflexo das maravilhas de Florença invade a Galeria degli Uffizi

Outro item da minha estratégia: se você também se incomoda com o burburinho dos grupos, um Ipod poderá ser o seu oásis auditivo (embora não sejam contemporâneos das obras em exposição, Vivaldi e Mozart combinam maravilhosamente. E Chet Baker e John Coltrane não têm contraindicações nunca).

Divida a visita com paradas estratégicas no terraço de Uffizi, para "limpar" o olhar e evitar aquela saturação tão característica de visitas mais longas a museus. 

Tenho certeza que ninguém fica imune à sensação de ter visto a essência da beleza após uma visita à Galleria degli Uffizi.

⭐ Galleria dell'Accademia

Aqui, muita atenção: nada de pular essa visita porque já viu a réplica do Davi de Michelangelo na Piazza della Signoria.

Davi, de Michelangelo, o maior espetáculo (mas não o único) da Accademia

Eu gosto muito das estátuas expostas na Loggia dei Lanzi, na famosa praça (sou louca pelo Rapto das Sabinas, de Giambologna), mas confesso que acho o lugar um pouco saturado — eu ia dizer "poluído", mas ia levar tomatadas.

O Davi de verdade, exposto na Accademia, paira enorme, soberbo, acachapante, no salão principal do museu. É uma visão celestial, uma emoção inesquecível.

Coleção de pinturas pré-renascentistas da Galleria della Accademia

Mais atenção ainda: embora espetacular, o Davi não é a única maravilha da Accademia. Lá também estão expostos os Quattro Prigioni, também de Michelangelo e igualmente arrebatadores.

E o segundo andar do museu, sem as multidões suspirando pelo Davi, é um pequeno paraíso florentino: tem uma coleção de pinturas do Século 14, além da coleção de ícones russos... Uma festa quase privê, pois pouca gente se dá ao trabalho de subir as escadas.

Quer ver maravilhas em Florença sem pagar ingresso? A Loggia dei Lanzi, na Piazza della Signoria, é uma galeria aberta que exibe esculturas impressionantes, como O Rapto das Sabinas, de Giambologna

Perseu com a Cabeça da Medusa, de Cellini, na Loggia dei Lanzi

Igrejas em Florença

⭐ Igreja de Santa Maria Novella

Tem afrescos apaixonantes e zero de fila. Preste atenção à Santíssima Trindade, de Masaccio, uma Vida de João Batista, de Ghirlandaio e, na Capela Strozzi, ilustrações inspiradas na Divina Comédia, de Dante.

⭐ Igreja de San Lorenzo

A Igreja de San Lorenzo era frequentada pela poderosa Família Medici, que mandou em Florença por quase 300 anos. Como eles também nadavam em dinheiro, já da pra imaginar o quanto investiram na igreja da família.

San Lorenzo foi um projeto de Bruneleschi, o mesmo genial artista que construiu a cúpula do Duomo de Florença. Mas acho que o maior espetáculo do conjunto de São Lourenço são as Capelas Medici, que têm ingresso e entrada diferente do corpo principal da igreja.

São Lourenço era a igreja dos Medici

A mais linda é a Capela do Príncipe, com as paredes em mosaico de pietre dure — mármores nas cores mais impressionantes. Na cripta, as esculturas em mármore branquinho buscam luz não sei aonde para iluminarem tudo ao redor.

Museu das Capelas Medici - Igreja de San Lorenzo, Piazza Madonna degli Aldobrandini, 6, de segunda a domingo, das 8h15 às 13h50. Entrada € 6.

O Duomo (Catedral) de Florença é deslumbrante de todos os jeitos

⭐ Duomo de Florença

Sempre sitiado por multidões, o Duomo é o cartão postal maior de Florença. A igreja é deslumbrante de todos os jeitos: por dentro, por fora, na engenharia absolutamente impossível para a época de sua cúpula — brilhantemente resolvida por Bruneleschi, na delicadeza dos detalhes....

A Catedral de Florença é é pra ser visitada várias vezes (aproveite que a entrada é gratuita), pra ser olhada pelo lado de fora nas várias horas do dia (o movimento do sol altera a percepção que se tem de sua intrincada decoração exterior), pelos mais diversos ângulos, de perto, de longe.

Oficialmente, é a Basílica de Santa Maria del Fiore, a Catedral de Florença. Certamente, uma das igrejas mais de grife do planeta: além da cúpula projetada por Bruneleschi, tem campanário desenhado por Giotto, afrescos de Vazzari, coro de Donatello...).

Saiba mais neste post: Visita ao Duomo e ao Batistério de Florença

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