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Catedral Nova de Salamanca, uma atração espetacular numa
cidade cheia de atrações espetaculares |
Que ela é um espetáculo, eu já sabia. O que eu não imaginava é que fosse encontrar tanto o que fazer em Salamanca. Os dois dias inteiros que programei para ver a cidade passaram voando e fui embora com a certeza de que poderia ter encontrado mais atrações para preencher uma estadia mais longa.
A cidade tem duas catedrais, uma das praças mais lindas da
Europa (a Plaza Mayor), uma das instituições de ensino superior mais antigas do
continente (a Universidade de Salamanca), uma ponte do tempo dos romanos, uma
profusão de igrejas e palácios, um palacete modernista que abriga um Museu de
Art Nouveau e Art Déco, ruas medievais encantadoras, muralha...
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Cervantes já avisava: esta é uma cidade de gente jovem, livre e bem humorada |
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O que dizer de uma cidade que tem uma das praças mais lindas da Europa (no alto) e uma das universidades mais antigas do continente? |
Ufa! Tem muito o que fazer em Salamanca mesmo e o mais impressionante é que a cada atração que eu visitava, ficava tentada a dizer que foi a coisa mais linda que tinha visto na cidade. Só pra ser desmentida pela atração seguinte — na hora de ir embora, declarei o empate coletivo e saí carregando a bela Salamanca inteirinha no coração.
Isso porque nem comecei a falar na parte profana da coisa:
fazer farra em Salamanca é bom demais! Ou vocês acham que uma cidade com
tradição universitária desde o Século 12 ia deixar por menos? (Mas disso eu vou falar em outro post).
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Casa Lis, palacete modernista que abriga o Museu de Art Nouveau e Art Déco de Salamanca |
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Salamanca é linda até de longe: vale a pena atravessar a Ponte Romana pra ver esse ângulo da cidade |
Veja quanta coisa maravilhosa você vai ver na incrível Salamanca:
O que fazer em Salamanca
⭐Plaza Mayor de Salamanca
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A Plaza Mayor de Salamanca é sempre apontada como uma das mais bonitas da Europa |
Como toda praça maior espanhola que se preze — e as ágoras gregas e fóruns romanos antes delas — a Plaza Mayor de Salamanca era o centro político e social da cidade. E isso bem antes de ganhar suas estonteantes feições atuais, no Século 18.
Ainda hoje, a Plaza Mayor vive lotada. Os locais passam
apressados ou aproveitam os inúmeros bares e cafés instalados sob os pórticos (um deles, o Café Novelty, é o mais antigo da cidade, velho ponto de boemia).
E os visitantes, como eu, ficam dando voltas e mais voltas, meio bestas com
tanta beleza.
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As feições atuais da Plaza Mayor são do Século 18 |
A praça também preserva muito de sua importância política, abrigando a sede da Câmara Municipal, Casa Consistorial.
O desenho da ágora de Salamanca segue o modelo consagrado pela Plaza Mayor de Madri, uma praça fechada, cercada de construções de fachadas harmônicas (porém não exatamente simétricas), dominada por quatro pavilhões majestosos. Além da Casa Consistorial, o Pavilhão Real, o de San Martín, do Consistorial e dos Petrineros.
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Muitos bares, cafés e restaurantes funcionam ao redor da Plaza Mayor |
Apontada como uma das praças mais belas da Europa (numa disputa acirrada com a Grand Place de Bruxelas pelo primeiro lugar) a Plaza Mayor de Salamanca é um primor barroco entalhado em pedra dourada. Ela é capaz de, sozinha, justificar a visita à cidade.
⭐Universidade de Salamanca
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Os edifícios históricos da Universidade de Salamanca se concentram em torno do Pátio de Escuelas. Ao fundo, o edifício das Escuelas Mayores |
A Universidade de Salamanca é celebrada como a mais antiga da Espanha, fundada em 1218. Os séculos de tradição e a beleza dos edifícios-sede a converteram em uma das atrações mais visitadas em uma cidade onde não faltam lugares e monumentos maravilhosos.
Os edifícios históricos da Universidade — Escolas Maiores, Escolas Menores e Hospedaria dos Estudantes, hoje convertido em Reitoria — são um escândalo de bonitos. Eles começaram a ser construídos apenas no início do Século 15, cerca de dois séculos depois da fundação da instituição.
Concentrados em torno de uma praça, os edifícios impressionam por suas fachadas de pedra, ricamente entalhada em estilo plateresco (uma expressão castiça da Renascença Espanhola, que incorpora elementos mudéjares ao gótico).
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Portal da Hospedaria dos Estudantes |
Na visita, é possível ver salas de aula, claustros e pátios da universidade. No prédio das Escolas Menores está exposto o painel Céu de Salamanca, afresco do Século 15 do artista Fernando Gallego representando signos zodiacais e constelações. Pena que a sala estava fechada quando visitamos a universidade.
O primeiro edifício construído para a Universidade de Salamanca foi o Colégio Maior de São Bartolomeu (Edifício de Escuelas Mayores), no ano de 1401. Depois vieram a Hospedaria de Estudantes e as Escolas Menores.
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A decoração plateresca nos edifícios da Universidade de Salamanca não poupa detalhes |
Salamanca a primeira instituição universitária da Espanha a receber alunas. As pioneiras foram Beatriz Galindo (1465 – 1535), conhecida como La Latina (sim, vem dela o nome do bairro de Madri), e Luisa de Medrano (1484 – 1527).
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Beatriz Galindo, La Latina, empresta seu nome a um dos bairros mais tradicionais de Madri, onde é homenageada com uma estátua no Paseo de Extremadura |
Medrano também foi a primeira mulher a dar aulas em uma Universidade em toda a Europa — em Salamanca, sim, onde Beatriz Galindo também seria professora de Retórica e Filosofia.
A escritora Beatriz Galindo foi, durante 19 anos, preceptora da Rainha Isabel I de Castela e de seus filhos. Como a família queria que ela ingressasse num convento, permitiu que ela estudasse na Escola de Gramática.
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Edifício das Escolas Menores de Salamanca |
Universidade de Salamanca - dicas práticas
Edifício de Escuelas Mayores
Calle Libreros nº 30
Horários: de 16 de outubro a 31 de março, de segunda a sábado
*exceto feriados), das 10h às 19 horas. De 1º de abril a 15 de outubro, de
segunda a sábado, das 10h às 20h. Ao longo do ano, o funcionamento aos domingos
e feriados é das 10h às 14h.
Ingressos: € 10. Estudantes e maiores de 65 pagam meia-entrada. Crianças
até 12 anos entram gratuitamente. Audioguia: € 2.
Casa-Museu Miguel de Unamuno
Calle Libreros nº 25
Horário: de segunda a sábado das 10h às 14 horas. Fecha aos
domingos e feriados e no período entre 11 de dezembro e 9 de janeiro.
Ingresso: € 4
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Pátio das Escolas Menores |
Horários: de 16 de outubro a 31 de março, de segunda a sábado (exceto feriados), das 10h às 19 horas. De 1º de abril a 15 de outubro, de segunda a sábado, das 10h às 20h. Ao longo do ano, o funcionamento aos domingos e feriados é das 10h às 14h.
Ingresso: Entrada gratuita
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Vi muitos museus lindos nessa viagem, mas este é especial |
O forte do acervo são as artes decorativas, mobiliário e
joias datadas desde a Belle Époque, alvorecer da Art Nouveau, até as décadas de
1920/1930, quando reinou a art déco.
A enorme coleção de vidros (luminárias, vasos e objetos
decorativos) é daquelas belezas de deixar a gente sem fôlego. Em destaque, as peças
de Émile Gallé, um dos papas da Art Nouveau, e René Lalique, um deus da art déco.
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A única área do museu que pode ser fotografada é o café, que
já dá uma boa ideia de como é preciosa a decoração da Casa Lis — e o
acervo é ainda mais lindo |
O museu também se orgulha muito da sua vasta coleção de criselefantinas, pequenas esculturas de marfim, com elementos de ouro, bronze e outros materiais.
A Casa Lis foi construída na muralha de Salamanca. Inaugurada em 1905 é o único exemplar do Modernismo em Salamanca — dizem que
a sociedade local, à época da inauguração, reagiu com certo desconforto àquela
ousadia de vidro e ferro em uma cidade marcada pelas pedras entalhadas do
plateresco.
O resultado, porém é apaixonante. Aquela orgia de vitrais e
volteios florais tão Art Nouveau consegue competir pelo título de rainha da
beleza de Salamanca sem fazer força.
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A Catedral Nova de Salamanca é um colosso |
⭐Catedral Nova e Catedral Velha de Salamanca
Acesso pela Catedral Nova, Plaza Juan XXIII, s / nIngresso: € 10, com audiogiuia incluído. Entrada gratuita todos os domingos, das 16h às 18h.
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A Catedral Nova faz a gente se sentir pequenininha |
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Faça a visita com calma, pra ver todos os detalhes. Vale a pena |
A visita às catedrais de Salamanca é combinada em um único
ingresso. O acesso é pela Catedral Nova — prepare-se para o choque com a
imensidão do espaço, as alturas vertiginosas e a decoração deslumbrante e segue
para a mais humilde Catedral Velha, que, ainda assim, não deixa de
impressionar.
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O coro (no alto) e as capelas da Catedral são estonteantes |
Antes de entrar, vale dar voltas em torno do conjunto das catedrais, um perímetro de mais de 600 metros, para apreciar a profusão de detalhes dos portais, fachadas, torres e adornos ricamente talhados em pedra.
Depois, reserve elo menos duas horas para ver o interior das
duas igrejas e seus preciosos ornamentos.
A Catedral Nova de Salamanca foi construída em estilo gótico
tardio, mas incorpora muitos elementos barrocos, o estilo que foi se tornando
dominante à medida que as obras da igreja avançavam. A Capela Maior e o coro
são belíssimos e a gente chega a perder o fôlego com tantos detalhes preciosos
nas 20 capelas laterais.
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A Catedral Velha tem afrescos maravilhosos. O mais famoso é O Juízo Final, sobre o altar-mor |
Pra ajudar a gente entender o percurso pela a igreja, sacristia e outros espaços, o audioguia (tem narração em português) é uma mão na roda.
Um corredor leva o visitante à Catedral Velha, um misto dos
estilos românico e gótico. Ela levou um pouco mais de 100 anos para ser
construída, entre os séculos 12 e 13, mas talvez seu maior destaque seja o
altar-mor do Século 15.
Menos luminosa e mais acanhada que sua irmã mais nova, a Catedral Velha arrebata o coração do visitante com seus magníficos afrescos.
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Os Jardins de Calixto e Melibea foram inspirados nos
protagonistas de uma das obras mais importantes das letras espanholas |
Calixto e Melibea são os protagonistas da obra A Celestina,
de Fernando de Rojas, de 1499, considerada um marco das letras espanholas.
Um recanto sossegado, com árvores frutíferas, arbustos e
plantas ornamentais.
Ingresso: € 4
Junto com a Catedral Nova, a Igreja e Mosteiro de San
Esteban são as construção mais impressionantes que vi em Salamanca — o que não
é dizer pouco, em uma cidade onde a cada momento a gente tem a impressão de estar
ouvindo trombetas pelo espetáculo de seus edifícios.
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A decoração do claustro é impressionante |
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Piso superior do claustro do Mosteiro de San Esteban |
Além de visitar o interior do mosteiro de San Esteban, certifique-se de passar por lá em variadas horas do dia, pra ver o efeito que os diversos ângulos do sol produzem em sua magnífica fachada minuciosamente entalhada.
O Mosteiro de San Esteban pertence à Ordem dos Dominicanos e
tem suas origens no Século 13. As feições do conjunto que vemos hoje, porém,
são do Século 16, em estilo plateresco.
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A Escadaria del Soto foi um prodígio de engenharia em sua
época |
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Esta figura entalhada no topo da escadaria seria a
representação de Maria Madalena |
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No coro alto está o afresco O Triunfo da Igreja, de Antonio
Palomino (no alto). De lá, a visão para o altar-mor é espetacular (mais um
motivo para encarar a escadaria) |
Se a fachada já impressiona muito, o interior do Mosteiro é de cair o queixo. Preste atenção no maravilhoso altar-mor da igreja, do Século 17, em estilo barroco, com todos os entalhes e douramentos que se espera desse tipo de peça.
O deslumbrante coro alto da igreja vale cada degrau pra chegar lá — ainda mais que a subida é pela monumental Escadaria del Soto, uma atração em si mesma. A escada foi um prodígio de engenharia na época de sua construção, o Século 16, pois apoia-se unicamente nas paredes a seu redor, sem qualquer pilar.
Horário: de segunda a sábado, das 10:30h às 12:45h e das
16:30h às 19h
Ingresso: € 2
O Convento de las Dueñas fica bem em frente ao Mosteiro de
San Esteban e merece uma visitinha. Construído em estilo mudéjar no começo do
Século 15, ele tem um claustro plateresco lindíssimo, de 1533.
Oficialmente Convento de Santa María, o nome de Las Dueñas
vem origem das freiras que lá ingressavam, viúvas ou filhas sem dote da nobreza
(Dueñas, ou Senhoras, como eram chamadas).
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Alguns vestígios do antigo palácio mudéjar ainda estão
preservados no convento |
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A Catedral de Salamanca vista do claustro do Convento de las
Dueñas |
Ele data do Século 15 e antes de ser transformado em clausura foi um palácio em estilo mudéjar, de cuja decoração original ainda restam alguns elementos.
Outra atração do Convento de las Dueñas são os doces feitos
pelas freiras que ainda vivem lá. Eles podem ser comprados logo na entrada,
onde quem nos atendeu foi uma freira portuguesa muito simpática. Eu adorei os
polvorones feitos pelas freirinhas.
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Quando você achar que já viu todas as belezas de Salamanca, experimente contemplar a cidade da Ponte Romana |
Quando a gente começa a achar que Salamanca já usou todos os
seus truques de sedução — que funcionaram direitinho — está na hora de caminhar
para o Sul, além das muralhas, até a Ponte Romana, só pra descobrir que essa
cidade não tem limites na arte de encantar olhares e corações.
A Ponte Romana, sobre o Rio Tormes, forma um conjunto muito
bonito com a área verde que a cerca. Mas não é por isso que você vai sentir seu
coração sapateado de paixão. É que depois de cruzar a ponte, hoje exclusiva
para pedestres, você vai ter uma visão de Salamanca daquelas de fazer o coração
dar uma paradinha.
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Um javali celta guarda a cabaceira da ponte mais próxima da cidade |
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A Ponte Romana de Salamanca foi palco de uma batalha feroz durante as Guerras Napoleônicas |
A visão da catedral, dos restos das muralhas, torres e campanários da cidade, dourados pelo sol da manhã (vá cedo) ou ao cair da tarde, é simplesmente a melhor atração de Salamanca.
A Ponte Romana de Salamanca é uma construção do Século 1º
a.C., parte de uma estrada que ligava Mérida a Astorga. A lenda, porém, atribui
a obra a Hércules — o cara que entre uma façanha e outra, tipo matar hidras malévolas
e sequestrar Cérbero, fazia bico como Niemeyer/Lúcio Costa, construindo cidades
como Cádiz,
pontes e muralhas Península Ibérica afora.
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O entorno da Ponte Romana é um parque muito bem aproveitado pelos moradores de Salamanca |
Se a lenda é real ou não, não vou debater. O que sei é que a Ponte Romana é tão forte quanto o pai: até meados do Século 20, ela foi o principal acesso a Salamanca, aguentando tráfego pesado sem chiar. Hoje, aposentada, ela é o centro de uma área de lazer adorável.
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A visita ao Arquivo Geral da Guerra Civil Espanhola foi uma das atividades mais interessantes na minha passagem por Salamanca |
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Cartazes, material de propaganda, livros e jornais também ajudam a contar a história de um dos episódios mais marcantes do Século 20 |
Esta é a origem do Arquivo Geral da Guerra Civil Espanhola, uma vasta coleção de documentos roubados de sindicatos, partidos políticos, organizações sociais, escolas, universidades e órgãos de governo do tempo da República, organizados em Salamanca sob a guarda de órgãos de repressão.
O arquivo hoje é aberto a pesquisadores e mantém um pequeno
museu que conta um pouco do conflito, um dos episódios mais marcantes do Século
20.
Instalado no antigo Colégio de San Ambrosio, um edifício de 1715, e em um moderno anexo, o Arquivo Geral da Guerra Civil Espanhola é hoje uma fonte imprescindível a historiadores e outros pesquisadores do período, assim como sustentação para ações de reparação movidas até hoje por vítimas da repressão e seus descendentes.
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Cartaz usado na alfabetização de camponeses durante a Segunda República Espanhola |
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Conclamação à unidade das forças que apoiavam a República durante a Guerra Civil |
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A loja maçônica foi montada pelos franquistas como um deboche, mas acabou virando documento |
No museu, um percurso bem didático e bem organizado oferece ao visitante elementos para compreender o conflito e suas consequências — 36 anos de um regime que insistia em manter a Espanha na Idade Média, quase meio milhão de exilados, 367 mil pessoas encerradas em campos de concentração e 50 mil assassinadas.
O Arquivo Geral da Guerra Civil Espanhola tem uma cessão dedicada
à maçonaria, organização que não escapou à perseguição franquista. Uma “loja
maçônica” montada pelos franquistas com material apreendido e que pretendia ser uma sátira pode ser visitada.
Lembrar de ditaduras, fascismo e repressão nunca é um programa agradável. Mas conhecer a história é fundamental pra evitar novas tragédias.
Calle de la Compañía nº 2
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Em frente à Casa de las Conchas está a igreja barroca de La Clerecía, do antigo Real Colegio del Espíritu Santo, que pertenceu à Ordem dos
Jesuítas |
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A fachada da Casa de las Conchas é muito mais famosa, mas a decoração interna do palácio também é maravilhosa |
Depois de se esbaldar fazendo foto da fachada, aproveite que
a entrada no edifício é livre e suba até o andar superior pra contemplar toda a
beleza do interior da Casa de las Conchas.
Um ano atrás estive em Salamanca por dois dias ; visitei quase todos esses locais mas nada comparáveis com a visão e as fotografias de uma boa jornalista fotógrafa. Obrigada @fragatasurprise.com
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